Mulheres

A fome no Brasil tem rosto de mulher

Erika Andreassy, da Secretaria de Mulheres do PSTU

8 de junho de 2022
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Protesto em Higienópolis contra a fome. Foto Elineudo Meira/Jornalistas Livres

A Fundação Getulio Vargas divulgou pesquisa que mostra que cresceu de 30% para 36% o número de pessoas vivendo em situação de insegurança alimentar, das quais 64% são mulheres. Ou seja, de cada três pessoas que passam fome no Brasil duas são mulheres.

O Brasil está entre os cinco maiores produtores e exportadores de alimentos do mundo. No cultivo de grãos, o país ocupa a quarta colocação. É o maior produtor de açúcar e café, o maior exportador de milho e o maior produtor de soja. Somente em 2020 quase 2,2 milhões de toneladas de carne bovina foram exportadas para o estrangeiro.

Esses dados contrastam com o aumento da miséria e da fome. Uma dolorosa realidade retratada nas cenas grotescas que ganharam os noticiários no início deste ano, com pessoas revirando caminhões de lixo em busca de alimentos ou disputando um lugar na fila do osso. A maioria das pessoas vivendo nessas condições são mulheres negras e mães solo. Com o aumento da inflação, a queda da renda e os índices de desemprego feminino, a tendência é essa situação piorar.

De volta ao mapa da fome

O aumento da insegurança alimentar no Brasil vai na esteira de uma realidade mundial. Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), a pandemia empurrou mais 118 milhões de pessoas para a fome no mundo em 2020. Nesse período entre 720 e 811 milhões de pessoas passaram fome, um retrocesso de 15 anos.

Mas, pela primeira vez, a insegurança alimentar brasileira superou a média mundial. O país teve um aumento quatro vezes maior no cenário da fome, sendo que a insegurança alimentar feminina chega a ser seis vezes maior que a média. A situação do Nordeste é uma das mais graves. Segundo inquérito nacional da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, em 2020, o índice de insegurança alimentar chegou a 70% na região.

A fome no país aumenta na mesma proporção que a fortuna dos bilionários. Em plena crise sanitária, a fortuna dos mais ricos aumentou 30%, e o Brasil ganhou dez novos bilionários. O 1% mais rico passou a concentrar metade da riqueza do país, sendo que apenas 20 pessoas detém hoje mais riqueza que 60% da população.

Uma combinação cruel para as mulheres

Nem a desigualdade social, nem o recorte de gênero e raça da pobreza e da fome são produto do acaso, mas do modo de produção capitalista, onde a riqueza de uns poucos se dá às custas do empobrecimento da maioria e pela combinação de opressão e exploração. A opressão sobre as mulheres e negros serve para dividir e estratificar a classe trabalhadora, ajudando a manter um exército de desempregadas e de desempregados que, diante de condições miseráveis de vida, aceitam submeter-se à superexploração, a ganhar salários mais baixos e a relações precárias de trabalho.

A opressão funciona como um mecanismo de regulação do mercado de trabalho, uma vez que o sistema não garante emprego para todos. No caso das mulheres, ao menor sinal de crise capitalista, são mandadas para casa sob a justificativa de que o salário da mulher é “complementar”, mesmo que 45% das famílias brasileiras sejam chefiadas por mulheres.

A naturalização das tarefas domésticas e de cuidado pelas mulheres ajuda a disfarçar que o problema é o capitalismo, pois se o trabalho doméstico fosse socializado (com creches e escolas para todas as crianças, lavanderias públicas e restaurantes populares, espaço de convivência para idosos e de cuidados para os doentes e portadores de necessidades especiais, etc.), não haveria desculpas para as mulheres serem preteridas no mercado de trabalho. Ao mesmo tempo que aliviaria a sobrecarga doméstica, parte desses serviços ainda ajudaria a combater a pobreza e a fome e a melhorar a vida da população.

Causas

Atacar o problema de fundo

À fome se somam 30 milhões de pessoas que não possuem casa para morar, as tragédias produzidas pela emergência climática, os ataques aos direitos e conquistas sociais, o desmonte dos serviços públicos etc.. Essa situação que não é de hoje foi agravada pelo governo Bolsonaro e seu projeto de rapina, mas não vamos sair dela se não atacarmos o problema de fundo. Por isso a estratégia eleitoral do PT e da frente ampla é uma falácia, pois significa se aliar justamente à burguesia, que se beneficia dessa situação. É preciso responder a essa realidade com um programa de independência de classe que aponte para a superação desse sistema, sendo que a candidatura da Vera está a serviço desse programa e dessa estratégia.