Mulheres

Feminicídio e violência às mulheres no Brasil e no Rio de Janeiro

Dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública apontam que, de janeiro a outubro de 2023, foram registrados 1.158 feminicídios no Brasil

PSTU Rio de Janeiro

6 de janeiro de 2024
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O ano de 2022 foi marcado pelo maior índice de descumprimento de medidas protetivas de urgência (MPUs) | Foto: Mídia Ninja

Paula Falcão, militante do PSTU-Rio Janeiro

Na última semana de dezembro, uma reportagem do RJ2 (TV Globo) revelou dados alarmantes relacionados ao descumprimento de medidas protetivas no Estado. Dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) mostram que de janeiro a setembro do ano de 2023, 3.309 medidas protetivas de urgência (MPU) foram descumpridas no Estado. Isso significa que 12 homens descumpriram por dia a determinação judicial de afastamento. Em 2022 esse número foi de 10 casos/dia, demonstrando um crescimento nos índices.

A situação do estado reflete a situação no Brasil. O ano de 2022 foi marcado pelo maior índice de descumprimento de MPUs desde 2018 (de 1070 casos para 3.587). A situação se agrava ainda mais quando pensamos que a maior parte das mulheres que sofrem violência doméstica sequer conseguem chegar a solicitar proteção. Dados do Dossiê Mulheres do ISP demonstram que no ano de 2022, das 111 vítimas de feminicídio no Estado, apenas 17 tinham MPU vigente quando foram mortas (cerca de 15%).

Esse dado vem acompanhado da alarmante situação de violência contra a mulher no país e no estado. O Ligue 180 registrou mais de 74 mil denúncias de violência em 2023. Dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública apontam que de janeiro a outubro de 2023 foram registrados 1158 feminicídios no Brasil, e 85 no Rio de Janeiro. O que significaria uma queda de 2,44% comparado ao mesmo período do ano anterior.

Já os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, refletem uma situação de agravamento. Somente no primeiro semestre do ano passado, 722 mulheres foram assassinadas no Brasil Um aumento de 2,6% em relação ao mesmo período do ano anterior. Houve também um aumento de 14,9% nos casos de estupro, apresentando o maior patamar desde 2020 (período de subnotificação durante a pandemia). Isso indica que 4 mulheres foram vítimas de feminicídio por dia no Brasil. E a cada 8 minutos uma mulher ou menina foi estuprada em 2023. A alta dos casos se deu pelos altos índices da região sudeste que apresentou aumento de 16,2% nos casos entre os anos de 2022 e 2023, enquanto as demais regiões brasileiras apresentaram quedas. Enquanto em todo o Brasil houve queda de 3,4% no número de homicídios.  O número de assassinato de mulheres cresceu 2,6%.

No Rio de Janeiro, um dado chama atenção. Em dissonância com a região sudeste, o Rio de Janeiro vive uma redução nos casos de feminicídio. Mas ao mesmo tempo, expressa um aumento de 6,4% no número de homicídios praticados contra mulheres. Esse quadro pode mascarar a realidade e ser reflexo da dificuldade e despreparo dos órgãos de segurança em tipificar o crime contra a mulher no estado. De toda forma, superando os dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública, os dados do ISP mostram que em 2023, 91 mulheres foram assassinadas no Rio de Janeiro, vítimas de feminicídio, e que houveram 275 tentativas.

Outro dado importante sobre a violência no estado é o crescimento de quase 35% dos casos de violência psicológica (34,7%) e de violência sexual (5,9%). As maiores marcas desde 2014.

O governo Lula (PT) não reviu o corte de 70% nos recursos destinados ao combate a violência contra a mulher

A situação de violência se agrava diante da crise e decadência econômica do Estado

O Estado do Rio de Janeiro sofre com o desemprego e violência. O quadro geral é de aumento da fome, da miséria, e de cortes drásticos nos serviços públicos básicos. A segurança pública é setor que possui os maiores gastos, o que demonstra a crescente degeneração das condições de vida e a necessidade do controle social diante da barbárie.

A taxa de desemprego do Estado no 1º trimestre de 2023 foi de 11,6%. Sendo o Estado com o maior percentual de pessoas procurando emprego há mais de dois anos (42% da população desocupada). Entre as mulheres a taxa de desemprego passa de 14%, mesmo estas sendo as principais responsáveis pelo sustento na maioria dos lares. Os índices de investimento em áreas como habitação e assistência social não ultrapassam a casa do 1% da arrecadação do estado. As péssimas condições de vida dificultam ainda mais a possiblidade das mulheres conseguirem sair de uma situação de violência.

Essa situação econômica pode ajudar a explicar a ineficiência das medidas de proteção e combate à violência contra a mulher no estado. A MPU foi uma conquista da luta das mulheres, deferida a partir da Lei Maria da Penha. E mesmo depois da lei 13.641/2018, que tornou crime o seu descumprimento, ela não garante proteção. O fato é que embora a legislação esteja constantemente sendo aperfeiçoada, as previsões legais muitas vezes não se traduzem em melhorias na vida de milhares de mulheres trabalhadoras por não existirem medidas orçamentarias que viabilizem sua efetivação. A falta de confiança gerada diante da ineficiência das políticas de proteção, faz com que muitas mulheres não procurem ajuda, perpetuando assim o ciclo de violência.

No âmbito federal, o governo Lula (PT) não reviu o corte de 70% nos recursos destinados ao combate a violência contra a mulher previsto no plano orçamentário do governo Bolsonaro. E sua principal medida também vem da herança do seu antecessor, o projeto “Mulher, vive sem violência”, que prevê a construção de 40 Casas da Mulher Brasileira, nas capitais e algumas cidades do interior.  No mês de junho do ano passado, junto com Claudio Castro, Flavio Dino anunciou a construção de uma Casa da Mulher Brasileira no RJ. A medida custará em torno de 14 milhões, uma quantia que não está prevista dentro da lei orçamentária do estado que prevê cortes nas áreas de assistência social, saúde e educação como pilares do equilíbrio das contas do estado.

Para garantir a efetivação e ampliação da Lei Maria da Penha, precisamos de um governo dos trabalhadores.

A situação da violência contra a mulher é fruto da forma como produzimos a vida no sistema capitalista. Nesse modelo de sociedade, aqueles que ganham com o nosso trabalho, se apropriam do machismo para garantir maior exploração de uma parcela da nossa sociedade. Isso se materializa na redução dos salários e dos direitos das mulheres, ajudando a nivelar para baixo as condições de vida do conjunto da classe trabalhadora. Por isso o machismo, o racismo e a LGBTfobia são problemas do conjunto da nossa classe.

Só será possível reverter a situação de barbárie e violência que assola a vida das mulheres no Rio de Janeiro, a partir de políticas que atendam aos interesses dos trabalhadores e trabalhadoras. Uma política orçamentária que pare de beneficiar os grandes empresários, e que não priorize o pagamento da dívida pública do estado. Que coloque em primeiro plano um projeto de construção de empregos e moradias. Com investimento e ampliação do atendimento nos serviços públicos, juntamente com o fim das privatizações.

O Rio de Janeiro teve no ano de 2023 sua primeira secretaria de Mulheres do Estado, norteada pelo Plano Nacional de Políticas para Mulheres, e com mulheres no seu comando. A presença dessa ferramenta não significou mudanças práticas na realidade das mulheres cariocas. Isso prova que não podemos garantir nossos direitos dentro desse regime ou desse governo. Precisamos de outra forma de governar, em que as mulheres que sofrem com a violência e miséria possam por elas mesmas, de forma coletiva e organizada decidir as políticas para construir sua própria realidade. Um governo socialista!

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