RELATO | Fui ao Litoral Norte de São Paulo levar apoio e solidariedade às vítimas das enchentes
Vera, ex-candidata à Presidência da República pelo PSTU
Era bem cedinho quando pagamos a estrada – eu e os camaradas Vinicius Soares e Waldemir Soares – com destino ao Litoral Norte de São Paulo para encontrar com o nosso camarada Herbet Claros, diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos, que está coordenando uma campanha de solidariedade às vítimas das enchentes realizada pela entidade sindical. Por sinal uma campanha exemplar, envolvendo os operários nas fábricas e a população da cidade.
Fomos em dois locais, no último dia 1º: uma ocupação em Caraguatatuba e na Vila Sahy em São Sebastião, local mais afetado pelas enchentes onde morreram 65 pessoas soterradas pela lama. Não foi possível visitar a aldeia indígena na região. Os moradores afirmavam que apesar da suspensão das buscas ainda tem gente soterrada.
Quando encontramos com Herbert em Caraguatatuba, ele tinha já tinha organizado a ida à ocupação. Estava com a equipe do Sindicato e mais três jovens Agentes de Saúde do Sistema único de Saúde (SUS): as 3JU. É assim que elas falam de si, em tom brincalhão, porque todas têm seus nomes começados por Ju. Elas atuam nas áreas atingidas e estavam organizando a distribuição das cestas básicas, roupas e móveis para os que necessitam. O Sindicato entrou em contato com elas, quando a comitiva foi levar a primeira remessa de donativos.
A ocupação em Caraguatatuba é numa área que ainda não se sabe se é pública ou privada. O que se sabe é que o prefeito está investindo nessa parte da cidade, lá vai ser construída uma importante rodovia, o que vai valorizar a região onde o pai do prefeito tem propriedade. E a causa da enchente foi o aterramento para favorecer esse empreendimento.
Conversa com os moradores
A visita à ocupação em Caraguatatuba foi rápida porque já era tarde e tínhamos que seguir para São Sebastião. Falamos com três pessoas: uma senhora que está recebendo roupas em sua casa para distribuir aos vizinhos, e outros dois moradores que gravaram um vídeo, que foi publicado em nossa live que realizamos no mesmo dia (assista a live aqui). Um deles é operário da construção civil, que está (re)construindo sua casa com a rescisão da última empresa que trabalhou e restos de construção da empresa onde seu cunhado trabalha. E outro é catador, está doente, com tuberculose e teve que sair do internamento para receber as vítimas das enchentes.
Na estrada ainda existiam pontos de bloqueio para reconstrução da rodovia. Tinham poucas pessoas trabalhando. Ao longo do percurso, podíamos ver a água que escorria dos morros na mata encharca. O risco permanecia latente.
Fomos barrados na principal entrada da Vila Sahy. Tinham vários carros de polícia, além de uma base de atendimento assistencial à população. A polícia estava por lá para garantir a segurança do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), que chegou ao local pouco depois de nós.
Nesse dia, o governador foi prometer às famílias estadia em pousadas e hotéis, sem informar por quanto tempo. Falou em construção de casas populares, mas também não deu prazos e nem disse o local onde seriam construídas.
Vila Sahy
A Vila Sahy é um bairro que se formou com a chegada de trabalhadores pobres, que chegaram a São Sebastião em busca de trabalho e de melhores condições de vida. Já está estruturado, alguns falaram que as ruas foram arrumadas a pouco tempo. E os mais pobres, entre os pobres, moram nas áreas mais inseguras e de difícil acesso. São residências que os moradores foram construindo ao longo do tempo. Tem pequenos comércios, muito comum nesses bairros. Muitos vão se construindo como parte do desemprego.
Os moradores estavam em choque com tudo que aconteceu. Eles falaram sobre o ocorrido. Partíamos sempre da pergunta de como estavam se se sentindo, depois pedíamos um relato sobre como tudo aconteceu. A maioria das pessoas que pedimos para falar no vídeo, toparam. E muitas, inclusive, questionaram a imprensa, que segundo eles, chega na comunidade, fala com os bombeiros, autoridades e pouco ouve a população.
Não tivemos como caminhar e ouvir mais por falta de tempo, pois tinha que editar e chegar ao local para realização da live. Isso exigia uma edição mínima das entrevistas e imagens. O companheiro Vinícius iniciou esse trabalho de edição dos vídeos ainda no carro, enquanto voltávamos para Caraguatatuba, local de onde realizamos a live.
Algumas das pessoas com as quais falamos estão no vídeo. Na edição, alguns depoimentos ficaram fora, mas vamos editá-los e disponibilizá-los em meu canal no YouTube (colocar o canal).
Seguir a luta por moradia de qualidade
Diante do que presenciamos e ouvimos, avaliamos a importância de retornar ao local quando se completar um mês do acontecimento, para verificar o andamento para solução desse crime premeditado pelo Estado, já que o governo de São Paulo e os prefeitos já sabiam que isso poderia acontecer. Foram avisados 48h antes do ocorrido e não moveram uma palha para proteger a população mais pobre que residem em áreas de risco, vulneráveis as fortes chuvas que ocorrem todos os anos.
Ao mesmo tempo é necessário exigir moradia gratuita para os desabrigados emergencialmente e um plano de habitação e saneamento para a proteção das famílias mais empobrecida da classe trabalhadora na região, que é uma região riquíssima. Somente no ano passado, as prefeituras dos quatro municípios receberam R$ 700 milhões de royalties só da Petrobrás.
Óbvio, que no caso em questão, começa pelo governo de São Paulo. E a depender da maneira de como Tarcísio conduza o problema, deve se credenciar politicamente no Estado. Por hora, as pessoas nesses locais não acreditam nos governantes. Inclusive, um deles cita o caso de Brumadinho. Por outro lado, não enxergam outra possibilidade, outro caminho.
Mas o projeto de habitação e saneamento básico é uma exigência dirigida aos governantes de todas as esferas, começando pelo governo federal. E alguns podem nos dizer que o presidente Lula acabou de assumir o governo. É verdade. Mas ele está governando pela terceira vez, sem contar os governos de Dilma. E o problema da moradia no Brasil tem séculos.
E se não foi resolvido até hoje é porque os interesses das construtoras e dos bancos são sempre mais importantes para os governos, incluindo os do PT, diante do flagelo das famílias que não têm onde morar ou moram em lugares inseguros correndo risco de morte. E as mortes são cada vez mais frequentes na medida em que a natureza é cada vez mais destruída e o aumento da pobreza da classe trabalhadora.
A organização da população que precisa de moradia segura é cada vez mais urgente. Não podemos esperar as próximas chuvas de verão e outono para mais uma vez contar mortos e desabrigados. Que cada olhar desolado, cada lagrima rolada, cada medo da próxima chuva sejam combustíveis que movam todas e todos nessa batalha e que ela não se detenha no meio do caminho, que ela não pare até que não falte um único lugar para onde se possa voltar, repousar e viver entre os seus.
Todo apoio e solidariedade à luta das comunidades atingidas
No último sábado, dia 11/03, moradores de bairros atingidos por enchentes e deslizamentos de terra em São Sebastião organizam um protesto para cobrar respostas do poder público quanto à construção de novas moradias para a população que vive em áreas de risco no município.
Moradores estão insatisfeitos com a falta de clareza quanto ao emprego de recursos anunciados por município, estado e União durante a crise, segundo lideranças comunitárias locais. Há também cobranças para que valores arrecadados por ONGs sejam auditados e destinados a um plano de amparo aos desalojados.
Cerca de 350 famílias estão desalojadas após as enchentes em São Sebastião. Os moradores estimam que o total de atingidos supere 1.000 famílias, já que muitas retornaram às residências.
Nós seguimos acompanhando a situação, estamos ao lado dos moradores na luta pela construção de novas moradias. Nenhum passo atrás nessa luta!