Negros

Racismo, injúria racial e caráter de classe da Justiça no sistema capitalista

Homem negro é indiciado por racismo contra italiano em Alagoas

Adriano Espíndola, de Uberaba (MG)

23 de janeiro de 2024
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Um homem negro será julgado por injúria racial em Alagoas. O juiz da 1º Vara de Justiça de Coruripe (AL), aceitou denúncia feita pelo MP-AL (Ministério Público de Alagoas) após representação proposta por um italiano branco. Segundo o Ministério Público, em uma conversa por WhatsApp, o denunciado afirmou que o homem que se apresenta como vítima de racismo tinha “cabeça europeia branca escravagista”.

Não restam dúvidas de que este é mais um daqueles casos que põe a nu o tão bem disfarçado caráter de classe da Justiça no sistema capitalista.

Antes de continuar cumpre esclarecer que Justiça de classe é um conceito que reflete a perspectiva de que o sistema jurídico e as instituições de uma sociedade são moldados e utilizados pela classe dominante — tipicamente a burguesia no capitalismo — para manter e legitimar seu poder e controle sobre os meios de produção e a classe trabalhadora e demais explorados.

Assim, ao contrário do que tanto nos fazem acreditar pelo chamado “senso comum”, a justiça no sistema capitalista, não é neutra ou imparcial; é uma justiça que perpetua as desigualdades de classe e a exploração econômica.

Além disso, é preciso entender o racismo – para além do limitado entendimento segundo o qual ele é algo estrutural e, por conseguinte, algo natural ao sistema- como um instrumento de opressão sistematicamente empregado dentro do sistema capitalista, com o objetivo de dividir e explorar a classe trabalhadora. Sob essa ótica, racismo não é um fenômeno isolado de atos discriminatórios individuais ou estruturais, mas um mecanismo que beneficia o status quo da classe dominante, frequentemente composta por grupos racialmente hegemônicos.

Assim, entender como injúria racial o fato de um homem negro, por supostamente ofender um homem branco, ao dizer que este tem uma ”cabeça branca, europeia e escravagista”, carece de contextualização dentro da real natureza da opressão racial, pois se considerarmos o histórico de discriminação e subjugação enfrentado pela população negra, as palavras do homem acusado pelo Ministério Público perante a 1ª Vara Criminal de Coruripe/Al, não se enquadram na dinâmica tradicional de racismo, inclusive via injúria racial, que a legislação, fruto da luta dos oprimidos, em tese, busca coibir.

Não nos esqueçamos que o racismo tem sua raiz na perpetuação da desigualdade e na manutenção de barreiras socioeconômicas que, historicamente, beneficiaram grupos brancos e ricos em detrimento de grupos negros e outros grupos racialmente marginalizados. A injúria racial, enquanto delito, destina-se a proteger indivíduos dessas minorias histórica e socialmente vulneráveis às práticas de racismo e discriminação.

Embora o ordenamento jurídico penal brasileiro não faça distinção racial do sujeito ativo do crime de injúria racial, a interpretação da lei, socialmente justa e sociologicamente correta, deveria ser permeada pela compreensão de que o racismo é uma questão de poder e hierarquia social, que está a serviço da manutenção da exploração da maioria da população numa sociedade dividida em classes sociais.

Trata-se, pois, de um processo digno de ser classificado com um processo kafkiano, pois um homem negro é acusado por injúria racial a um homem branco, num país marcado pela escravidão e pela opressão racial e, ainda, pela exploração desmedida da classe trabalhadora. É um processo que não leva em conta a posição social e histórica dos envolvidos, desconsiderando componentes essenciais que definem o racismo.

Assim, com a devida licença às autoridades envolvidas, pessoas que são apenas parte do sistema e acreditam estar exercendo suas funções, o que ressalvo apenas para não me tornar réu em seus processos, a acusação de injúria racial no caso em questão, demonstra um entendimento contextualizado do racismo, segundo a visão da classe opressora e exploradora no capitalismo, a burguesia, passando longe da compreensão da real função do racismo dentro do capitalismo, que é, como dito acima, um instrumento fragmentação e enfraquecimento da solidariedade entre os trabalhadores para facilitar sua exploração.

É por isso que defendermos a luta contra o racismo, como uma luta não apenas dos homens e mulheres negras, mas como uma luta de toda a classe trabalhadora, uma vez que ele está a serviço da divisão para melhor exploração da classe. Além disso, para lutar de forma coerente contra o racismo não se pode, como faz a esquerda reformista e/ou identitária, desvincular a referida luta das lutas pela superação do sistema capitalista por meio de uma revolução política, econômica e social, que destrua esse sistema, isto é, por meio de uma revolução socialista.

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