PSOL só poderá combater o arcabouço se romper com o governo
Não há dúvidas de que o arcabouço fiscal do governo Lula é um ataque aos trabalhadores e atende aos grandes capitalistas brasileiros e internacionais.
Chico Alencar, em nome da federação PSOL/Rede, apresentou dez emendas que, embora possam suavizar a proposta, não mudam a lógica desta. O patamar mínimo de gastos ser 0,6%, como está na proposta do governo, ou 2,5%, como está na emenda do PSOL, na prática ainda significa que a maioria dos recursos públicos se destinará para os ricos capitalistas. Ou poder gastar até 95% do ganho real da receita quando atingir a meta, contra 70% da proposta do governo, não muda o fato de que tudo isso ainda respeita a lógica capitalista neoliberal do superávit primário e primazia da remuneração dos banqueiros em detrimento dos demais gastos.
Retirar dos limites de gastos algumas áreas sociais, como o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e o piso da enfermagem, pode significar uma sobrevida em alguma área. Mas, de conjunto, o arcabouço é um atentado contra os direitos dos trabalhadores e do povo pobre em todas as áreas. Por isso, precisa ser derrotado em sua integralidade.
Desserviço
Apresentar emendas para “despiorar” o arcabouço fiscal é prestar um duplo desserviço aos interesses dos trabalhadores, em favor dos capitalistas. Primeiro, legitimará um projeto que ataca violentamente a classe trabalhadora, aposentados, serviços públicos e o povo pobre. Segundo, e talvez ainda mais importante, contribuirá para um retrocesso na consciência e organização da classe trabalhadora, difundindo a mentira e a ilusão de que um projeto comprometido com a responsabilidade fiscal, com os capitalistas, a quem o governo e o Congresso defendem, pode ser benéfico para os trabalhadores. Precisamos é de um plano dos trabalhadores de mobilização para derrotar esse arcabouço, que ataque esses mesmos capitalistas e se defenda contra o governo e o Congresso, exigindo o que lhes é de direito.
Acordão
Chico Alencar faz uma curiosa argumentação sobre o arcabouço ao afirmar que “o projeto original do governo sofreu ‘cajadadas’ que o tornaram extremamente restritivo”. É verdade que o projeto original apresentado por Haddad vem piorando na mão do relator Cláudio Cajado. Mas o próprio governo vem costurando e combinando essa versão final da proposta em reuniões entre o ministro e o relator. Ou seja, há um acordão que vem sendo construído pelo governo, centrão e a direita, para aprovar um arcabouço fiscal que agrade ainda mais todos os setores capitalistas.
Críticas para “ajudar” o governo
Mesmo criticando o arcabouço, a argumentação do PSOL não ajuda os trabalhadores a terem consciência do que vem se passando no país. Guilherme Boulos, por exemplo, disse que “o PSOL apoia e trabalha para que o governo Lula dê certo. Por isso, temos fortes preocupações com o texto”. Para Ivan Valente, o “PSOL é base de apoio a Lula, mas não poderia votar a favor desta proposta que cria uma camisa de força para o governo. O governo Lula tem que dar certo, para isso, precisa de investimento, não de amarras ao crescimento!”
Ou seja, o PSOL critica o arcabouço fiscal do governo em nome da defesa, do apoio e da ajuda ao próprio governo Lula. O PSOL se coloca a estapafúrdia missão de ser mais governista que o governo. Mas é o próprio governo que está implementando o arcabouço fiscal!
Limites
Romper com o governo e construir uma oposição de esquerda
A atuação do PSOL, ao colocar suas emendas a serviço do governo Lula em parceria com capitalistas, burgueses e a direita, dentro dos limites do sistema e da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), representa uma prisão perpétua na busca pelo eterno mal menor. Embora possa haver boas intenções por trás das emendas ao arcabouço, essa abordagem ainda está inserida na lógica da dominação capitalista e vai de encontro aos interesses dos trabalhadores, que estão sendo atacados pelo programa de Lula-Alckmin.
O apoio e a participação do PSOL no governo Lula foram marcados por confusões e malabarismos, com declarações contraditórias. E essa mesma forma de agir se repete nesse tema, fazendo críticas, mas acabando por apoiar ainda mais um governo que serve aos interesses da burguesia. Neste momento, é fundamental convocar a classe trabalhadora a não depositar confiança nesse governo.
É incrível que, mesmo depois de um ataque desse tipo, não haja nenhuma perspetiva de no mínimo mudar a orientação do PSOL em relação ao governo. Sair da base do governo no Congresso, entregar os cargos, sair de ministérios e romper com o governo não estão no horizonte da direção do partido.
É importante lembrar que foi com a reforma da Previdência, ataque desferido durante o primeiro governo Lula, que se originou o PSOL. O PT segue governando aos capitalistas e, pelas circunstâncias, está ainda mais subalterno aos interesses dos monopólios internacionais, dos banqueiros e da burguesia brasileira a eles associada. O PT não mudou. Quem mudou foi o PSOL.
Esse governo não está “em disputa”, como pensa a direção do PSOL. Apenas diferentes setores burgueses podem disputá-lo e, mesmo assim, dentro dos estreitos limites do teto de gastos, quer dizer, da manutenção da pilhagem do país e da extrema exploração da classe trabalhadora.
Os ativistas devem romper com o governo e construir uma oposição de classe e de esquerda que se enfrente com o governo e também seja ponta de lança na luta contra a ultradireita. Afinal, quem ajuda a ultradireita hoje é o governo, que apresenta um ajuste fiscal aplaudido pelo mercado e elogiado pelo chefe do Banco Central, o bolsonarista Campos Neto.