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Privatização do Metrô de Belo Horizonte é a primeira privatização do governo Lula-Alckmin

Vanessa Portugal

31 de março de 2023
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Nos últimos dias 23 e 24 de março, foi concretizada a privatização do metrô de Belo Horizonte. Trata-se de uma concessão pública de 30 anos à empresa Comporte, vencedora de Leilão realizado em dezembro de 2022.

A privatização do metrô de BH passou por várias etapas e, para ser entendida, é preciso alguns esclarecimentos. O processo que culminou no Leilão final foi construído passo a passo pelo governo Bolsonaro e Zema. O metrô de BH pertence à CBTU (Companhia Brasileira de Transporte Urbano), uma empresa federal que opera em alguns estados do País. Para a realização da privatização houve um desmembramento com a criação da CBTU-MG e a criação da VDMG (Veículo de Desestatização MG Investimentos), controladora de CBTU-MG.

Apesar do processo parcial de estadualização, a privatização só foi possível após o aval da Casa Civil e assinatura pelo BNDES do contrato de compra e venda de ações da VDMG, o que aconteceu no dia 23. No dia 24, Zema, governador de Minas Gerais, finalizou a transação assinando o contrato de concessão do Metrô.

O processo poderia ter sido paralisado tanto pelo Governo Federal, quanto pelo governo de Minas Gerais, no entanto, em relação ao último, não havia nenhuma expectativa dos trabalhadores. Zema, do partido NOVO, nome que disputa ser candidato à Presidência nas próximas eleições, foi reeleito em Minas com um discurso abertamente privatista. Apoiador de Bolsonaro, nunca escondeu sua política de destruição dos serviços prestados pelo setor público.

A “surpresa” veio do acordo firmado pelo governo Lula-Alckimim com Zema mesmo antes da posse. Em visita a Minas Gerais em dezembro de 2022, Alckimin declarou apoio ao leilão do metrô, algumas horas depois de ter se manifestado contrário. O leilão foi realizado, mas poderia ter sido facilmente anulado pelo Governo Federal. No entanto, essa nunca foi uma possibilidade. Foi o que o ministro da Casa Civil, Rui Costa, disse tanto para representantes do Sindicato dos metroviários, quanto em uma declaração dada ao jornal Estado de Minas em 12 de janeiro último: “Vamos modelar portos, aeroportos, projetos para atrair investimentos. Os que estavam prontos, como o metrô de Belo Horizonte, nós concordamos que ocorresse. Os outros, nós vamos ajustar a modelagem. Se é privatização, se é concessão, se é PPP, nós vamos identificar para cada projeto”.

O leilão poderia ser anulado por uma decisão política, uma privatização realizada no apagar das luzes de uma gestão anterior, os contratos ainda não haviam sido assinados, logo isso seria justificativa suficiente. Mas neste caso vários elementos apontavam e ainda apontam pela anulação do processo vejamos: a empresa arrematou o Leilão por R $25 milhões, sendo que os ativos da CBTU-MG estão estimados em R$ 175 milhões. Para a “modernização” da linha 1 e construção da linha 2, a empresa irá receber R$ 2,8 bilhões de recursos federais e R$ 400 milhões de recursos do Estado de Minas, provenientes do acordo assinado com a Vale para a reparação de danos causados pelo rompimento da barragem em Brumadinho. Caberá à empresa um investimento ao longo de 30 anos de apenas R$ 400 milhões; nas regras do processo os trabalhadores foram considerados ativos da empresa ou seja foram negociados juntos. Além disso tudo, a empresa não tem um plano consistente para a operação do metrô e nenhuma experiência com o serviço, pairam sobre a empresa compradora e denúncia de explorar trabalho escravo.

Em função da situação dos trabalhadores metroferroviários, o MPT (Ministério Público do Trabalho) recomendou que o BNDES não assinasse o contrato até que uma solução fosse apresentada. O MPT deu ao Governo Federal um prazo até 24 de março para apresentar um plano. Desconhecendo as recomendações do MPT, o contrato foi assinado um dia antes sem nenhuma alternativa aos 1600 trabalhadores, empregados públicos da CBTU que atuam no metrô de Belo Horizonte. E essa era a situação até o momento do fechamento desta matéria. Hoje por hoje os trabalhadores tem 2 alternativas: ou pedem demissão ou aceitam trabalhar para a COMPORTE, empresa que ganhou o leilão, até que a COMPORTE os queira.

Já a COMPORTE não tem a menor condição de operar o metrô. O metrô só conseguirá continuar operando se os trabalhadores atuarem para tal. Este é o motivo do Leilão de “porteira fechada”, considerando os trabalhadores como patrimônio da empresa e é a isso que o Governo Federal está cedendo, os trabalhadores são reféns da empresa e o Governo Federal até o momento está de acordo com o sequestro. Os trabalhadores podem e devem continuar sendo empregados públicos da CBTU, o que são até o momento, visto que não foram demitidos por esta empresa, a CBTU pode ceder estes trabalhadores para outros órgãos ou empresas federais ou para outras unidades da CBTU, o que não pode é descarta-los.

A novela que envolve o Metrô de BH

A privatização do metrô de Belo Horizonte está sendo construída há décadas. O metrô começou a operar em 1986, e o plano original previa a construção de pelo menos 2 linhas. A linha 1 – com 28,1 km, que ligaria a cidade de Contagem a Belo Horizonte e que hoje liga parcialmente o centro de Belo Horizonte ao vetor Norte da cidade é a única em operação. A linha 2 que previa ligar a região do Barreiro, a mais populosa da cidade, ao centro de BH, teve sua construção paralisada e abandonada, trata-se de 10,2 km. A história de abandono é o que marca o metrô de BH condenando a região metropolitana de Belo Horizonte a viver apenas do modal rodoviário como forma de transporte público.

A revitalização da linha 1 e a construção da linha 2 é o que está previsto no contrato da COMPORTE.

Em 2005 e depois em 2015 os governos federais chegaram a apresentar um plano de privatização que, no entanto, não foram levados adiante. Em 2019 iniciou um movimento de aumento da tarifa de forma que, de 2019 a 2021, a tarifa aumentou 250% passando de R$1,80 para R$4,50, se consideramos o trecho médio que o metrô atende, uma das passagens mais caras do país. De acordo com os metroviários, com o aumento da passagem o  número de passageiros diários do metrô caiu pela metade.

 Por que o transporte público não pode ser privatizado

Transporte público é um serviço obrigatório do Estado, assim como saúde, educação, limpeza urbana. Uma necessidade incontestável da população, principalmente nas grandes cidades, a privatização nega ao trabalhador o direito da população a este serviço. Vejamos um trabalhador desempregado não pode se locomover nem para procurar emprego caso não tenha o dinheiro da passagem; se uma pessoa estiver passando mal, não tem como chegar ao atendimento médico se não tiver o dinheiro da passagem e por aí vai. As passagens são caras, mesmo quando são subsidiadas pelo Estado e, em regra, não há previsão de tarifas sociais. Vamos ver o exemplo do transporte rodoviário de Belo Horizonte. A passagem em Belo Horizonte é de R$ 4,50. No ano passado, a prefeitura deu às empresas um subsídio de R$ 237,00 milhões, em 2022. Repare que o metrô foi leiloado por R$ 25 milhões. Este ano já está sendo estudado um novo subsídio.

Com o metrô a situação não será diferente, para que as tarifas, mesmo caras, consigam ser bancadas por uma parcela dos trabalhadores, as empresas irão exigir recursos do Estado para subsidiar o valor. O resultado disso é que muito dinheiro público é gasto para garantir o lucro dos empresários, que em regra prestam péssimos serviços.

No metrô de BH o que vemos é o Estado brasileiro pagando caro para uma empresa privada para que ela leve o metrô, e depois o Estado continuará a a pagar para que a empresa preste serviço ruim e cobre caro do usuário.

O transporte público dever ser considerado investimento do Estado, os recursos que estão neste momento sendo transferidos para a iniciativa privada devem ser investidos no metrô público, que deve garantir tarifas sociais para que os trabalhadores tenham o direito de se locomover na cidade.

Expansão já sem privatização: essa continua sendo nossa palavra de ordem.

Todo apoio à luta e greve dos trabalhadores metroferroviários

Os metroviários realizaram uma greve de 32 dias antes da concretização do acordo, e retomaram o movimento nesta terça-feira, 28 de março. A luta destes trabalhadores tem sido valorosa e merece todo nosso apoio e solidariedade. É muito importante que a CUT dos trabalhadores, central a qual o sindicato é filiado, inicie rapidamente um chamado à mais ampla unidade para uma campanha de denúncia contra a privatização do metrô, pela garantia do emprego dos trabalhadores e pela anulação da privatização. Este movimento é mais do que urgente, na verdade já deveria ter iniciado. No momento que fechávamos essa matéria, havia uma reunião marcada com o governo para a discussão da garantia dos empregos. Isto é o mínimo que o governo pode fazer neste momento. A luta pelo emprego é urgente e imediata e começa já a luta pela reestatização do metrô.