Braga Netto: Prisão escancara golpismo nas Forças Armadas e incapacidade do governo em combatê-lo
É preciso investigar e prender todos os golpistas e seus financiadores, e pôr fim ao Artigo 142
O sábado do dia 14 de dezembro amanheceu em polvorosa. Pela primeira vez, pelo menos após a última ditadura militar, um general de 4 estrelas era preso. Uma ação tardia, visto que as 884 páginas do inquérito sobre a tentativa de golpe já apresentavam fartos indícios do protagonismo de Braga Netto na ação golpista, mas que, mesmo assim, representa um grave revés a Bolsonaro.
Braga Netto foi chefe do Estado Maior das Forças Armadas e, no governo Bolsonaro, comandou o Ministério da Defesa e a Casa Civil. Na campanha, assumiu a vice de Bolsonaro e, pelas investigações da Polícia Federal, comporia uma eventual junta militar que assumiria o poder após o golpe.
A Polícia Federal emitiu o mandado de prisão preventiva após constatar que o general reformado colhia informes da delação do tenente-coronel e ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, a fim de alinhar narrativas no processo sobre o golpe. Ou seja, obstruía as investigações.
Dinheiro em sacola de vinho
Diante de novas informações e detalhes sobre a tentativa de golpe que incluía a tentativa de assassinato do presidente eleito, Lula, seu vice, Geraldo Alckmin e do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, Mauro Cid se viu em maus lençóis e teve seu acordo por um fio. Chamado novamente para se explicar, o passarinho cantou e Moraes resolveu manter a delação.
E as novas denúncias dão conta de que Braga Netto não só foi um dos artífices da tentativa de golpe, como ele mesmo botou a mão na massa. Ele teria entregue uma sacola de dinheiro em espécie para a chamada operação “Punhal Verde e Amarelo”, que sequestraria o ministro do Supremo e assassinaria a chapa eleita.
Ainda segundo a delação, Braga Netto teria dito que o dinheiro havia sido obtido junto “ao pessoal do agronegócio”. Provavelmente, o mesmo “pessoal” que financiou os acampamentos golpistas e o 8 de janeiro.
A expectativa agora é se o general também vai delatar ou não. O entorno do bolsonarismo duvidava que Mauro Cid, um “kid preto”, ou seja, um agente especial das Forças Armadas, delataria. Uma vez preso, o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro se mostrou tão covarde quanto seu ex-chefe e acabou abrindo o bico.
Fato é que, enquanto fechávamos esta edição, Braga Netto acabava de mudar de advogado, contratando um “medalhão” criminalista que, inclusive, fez o acordo de delação de Leo Pinheiro, da OAS durante a Lava Jato, e também já defendeu Zé Dirceu.
Conciliação
Governo Lula não enfrenta os golpistas
Braga Netto foi tachado de “laranja podre nas Forças Armadas”, cuja prisão seria uma “homenagem aos militares que foram firmes na defesa da democracia”. Essa fala não veio de algum integrante da cúpula militar tentando se desvencilhar da tentativa de golpe. Quem falou isso foi o deputado e ministro Paulo Teixeira, do PT.
Outro que ecoou esse mesmo discurso foi, evidentemente, o atual ministro da Defesa, José Múcio, nome de confiança do bolsonarismo cuja única e exclusiva função é passar pano para golpista. Segundo Múcio, há de se separar o “CPF do CNPJ”.
Há uma tentativa em curso, que une de alguma forma o bolsonarismo e o governo Lula, de circunscrever a tentativa de golpe e a crise nas Forças Armadas em alguns nomes, resguardando a instituição. Para Bolsonaro, isso interessa porque sua defesa argumenta que um eventual golpe não o beneficiaria. Já o governo Lula manteria sua política conciliatória com a cúpula das Forças Armadas, e não bateria de frente, inclusive, com o “pessoal do agro”.
Braga Netto fica em sua “cela”, na verdade uma sala com TV, ar condicionado e todo tipo de regalia, enquanto o resto, inclusive o general do Exército, Freire Gomes, que ouviu todo o plano golpista, mas resolveu não aderir, são aclamados como defensores da “democracia”. Enquanto que, na realidade, se a maioria da cúpula não aderiu de pronto, foi mais por medo, preferindo aguardar o desenrolar da tentativa para ficar do lado vencedor, fossem os golpistas, tanto melhor para eles.
Isso mostra que o governo Lula, que tem nas mãos uma oportunidade única de realizar uma devassa nas Forças Armadas, extirpando os golpistas, nem o mínimo do mínimo se mostra disposto a fazer.
Nenhuma anistia!
Investigação e prisão dos golpistas! Extinção do Artigo 142!
Não foi à toa que a Polícia Federal tenha encontrado na mesa do Coronel Flávio Peregrino, espécie de faz-tudo de Braga Netto, não só um resumo da delação de Mauro Cid, como vários documentos sobre o artigo 142, um entulho da ditadura que pode dar a entender que as Forças Armadas cumpririam um papel de “poder moderador”.
Para enfrentar o golpismo, é imprescindível extirpar de vez essa excrescência da Constituição. Mas já antes, para ontem, botar na rua José Múcio e toda a cúpula militar que, se não aderiram à tentativa de golpe, foram coniventes. E alterar toda a estrutura e, inclusive, formação das escolas militares.
É necessário avançar nas investigações, prender os golpistas, incluindo Bolsonaro e família, e o “pessoal do agro” e demais financiadores da tentativa de golpe.
Isso é o básico, o mínimo para defender as parcas liberdades democráticas e enfrentar o golpismo. Mas é preciso lembrar que a extrema direita, incluindo os que querem a volta da ditadura, só serão lançados de vez à lata de lixo da História quando mudarmos as condições sociais e econômicas da classe trabalhadora e da grande maioria da população. Exatamente o contrário o que o governo Lula vem fazendo.