Nacional

Indígenas denunciam a inoperância do governo Lula na proteção e demarcação de seus territórios

Roberto Aguiar, da redação

17 de abril de 2024
star5 (11 avaliações)
Em Brasília, indígenas cobram do governo Lula a demarcação das terras | Foto: Maiara Dourado/Cimi

“Quero destacar a inoperância do Estado brasileiro em fazer a proteção e demarcação do Território Pataxó, Pataxó Hã-Hã-Hãe e Tupinambá. Isso tem causado e é o vetor principal da violência que esses povos estão sofrendo”, pontuou Dinamam Tuxá, Diretor Executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em evento realizado no último dia 11, com a Defensoria de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU).

Lideranças indígenas presentes no evento ressaltaram que a demora na demarcação as coloca em risco direto, tendo em vista a atuação de milícias armadas junto aos invasores, e pediram a reestruturação dos Programas de Proteção de Defensores de Direitos Humanos, que “estão defasados e inoperantes”, como disse o dirigente da Apib.

Passado um ano e quatro meses do início do governo Lula, as soluções para impedir a invasão dos territórios indígenas não avançaram. Nessa reunião com a ONU, foram lembrados os casos do jovem Gustavo Pataxó, de 14 anos, e de Nega Pataxó Hã Hã Hãe, assassinados por fazendeiros na Bahia.

Críticas ao governo Lula

É unanimidade dentre os povos indígenas que a falta de demarcação dos territórios é a principal causa das invasões, ameaças e assassinatos. O governo Lula demarcou apenas oito Territórios Indígenas (TIs) em 2023, quando o movimento indígena esperava a demarcação de 14 TIs. O não avanço das medidas em defesa dos povos indígenas tem levado a que lideranças cobrem o governo petista com mais ênfase.

Em novembro do ano passado, em entrevista ao jornal “O Globo”, o Cacique Raoni (principal liderança indígena do nosso país) disse que Lula não cumpriu o que prometeu: “Ele me prometeu que iria fazer ações em prol dos povos indígenas, para que não existam mais essas ameaças e violência contra nós. E isso não está acontecendo”. Importante ressaltar que Raoni subiu a rampa do Planalto com Lula, na posse em Brasília.

“Pão e circo” não protegem vidas e territórios indígenas

Mês passado, na presença do presidente francês Emmanuel Macron, em Belém (PA), Cacique Raoni voltou a fazer cobranças públicas a Lula: “Quero pedir novamente que você trabalhe para acabar com o desmatamento, demarcar as terras indígenas, para as comunidades que não têm terra ainda. Quero pedir que você apoie a Funai e ela tenha orçamento para fazer o trabalho para as comunidades indígenas”.

Em janeiro deste ano, após a anuncio de que o garimpo estava de volta à Terra Yanomami, o ativista Daniel Munduruku criticou o Ministério dos Povos Indígenas (MPI), classificando a pasta como um espaço “cirandeiro”, que reproduz a “política do pão e circo”, com “muita festa, muita viagem internacional” e pouca ação.

Em reportagem publicada recentemente pelo portal “Sumaúma”, várias lideranças indígenas classificaram como importante a criação do MPI, mas também afirmaram que o governo Lula não tomou a pauta dos povos indígenas para si. A reportagem mostrou, em levantamento na agenda oficial do presidente, que, nos 14 meses de governo, a Ministra Sonia Guajajara (PSOL) teve apenas três audiências privadas com Lula para tratar de assuntos de seu ministério.

Lula sem convite para o Acampamento Terra Livre

De 22 a 26 de abril, acontecerá o Acampamento Terra Livre (ATL), em Brasília. São 20 anos do evento nascido de um protesto que durou dias, defronte ao Ministério da Justiça, culminando na ocupação do Congresso Nacional, em 2004.

As lideranças cogitam não convidar o presidente Lula para o evento, mas cobrar que os indígenas sejam recebidos no Palácio do Planalto, para debater suas reivindicações, principalmente as demarcações dos territórios. “A falta de mais demarcações foi uma grande decepção para a gente”, disse Toya Manchineri, dirigente da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), ao portal “Sumaúma”.

Valdelice Veron diante da imagem de seu pai, o cacique Marcos Veron, assassinado em 2003 | Fotos: Jeferson Choma

“Sem enfrentamento, não vamos conseguir nossas reivindicações”

A líder indígena Guarani-Kaiowá, do Estado do Mato Grosso do Sul, Valdelice Veron, ressaltou ao Opinião Socialista a expectativa dos povos indígenas com o governo Lula: “Tem uma expectativa que, no atual governo, as coisas mudem, mas não dá para contar com isso 100%. Nós temos que ir para a luta, para o enfrentamento. Sabemos que, sem o enfrentamento, sem a luta e a mobilização, não vamos conseguir nossas reivindicações”.

Valdelice Veron também destacou o papel de resistência que a ATL tem que cumprir: “20 anos de luta e de resistência. É um espaço de resiliência, de encontro de povos que realizam alianças políticas conforme a cosmologia indígena, para irmos à luta pela proteção e demarcação dos territórios indígenas”.

Os indígenas Guarani-Kaiowá são um dos povos mais atacados por ruralistas no Mato Grosso do Sul, estado que tem a maior população indígena na região Centro-Oeste. “É um estado marcado por conflitos territoriais, contra a expulsão das comunidades indígenas de suas terras, para garantir a redistribuição para a exploração agrária do território e, assim, nos embates que hoje travamos pela retomada das terras e pela demarcação de nossos territórios”, finalizou Valdelice Veron.