Lutas

Greve do funcionalismo federal se enfrenta com o ajuste fiscal do governo Lula, que beneficia os banqueiros

Paulo Barela, da CSP-Conlutas

11 de abril de 2024
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Manifestação de servidores federais no RJ Foto CSP-Conlutas

Os servidores públicos federais se levantam em mobilização em todo o país. O setor da educação federal realiza uma forte greve que se iniciou no dia 11 de março com a entrada dos técnicos administrativos das universidades federais. Na esteira desse processo, também entraram em greve, no dia 3 de abril, os técnicos e docentes dos Institutos Federais de Ensino. 

Esses dois movimentos pressionam no sentido da entrada dos docentes das universidades, que têm indicativo aprovado pelo Setorial das Federais do ANDES-SN para iniciar no dia 15 de abril. Além disso, ocorrem processos de paralisações pontuais e operação-padrão em outros setores, como Funai e áreas de arrecadação e fiscalização alfandegária.

O movimento que se desenvolve no setor é uma resposta dos trabalhadores ao reajuste zero em 2024 definido pelo governo Lula/Alckmin para sustentar uma política de déficit zero, teto de gastos com políticas públicas, via Arcabouço Fiscal, e a ameaça de uma nova reforma administrativa, além do pagamento rigoroso da dívida pública que consome quase a metade da arrecadação da União.

Expectativas frustradas

Os servidores federais foram os primeiros a romper com Lula-PT em 2003, em virtude da reforma da Previdência que atingiu em cheio conquistas históricas da categoria. A ruptura foi tão forte que, dentro do processo de enfrentamento na época, surgiram duas organizações alternativas ao PT e à CUT, o PSOL e a CSP-Conlutas, respectivamente. Esse divórcio litigioso se estendeu por muitos anos e foi atravessado por importantes ações da categoria, dentre essas, a maior e mais radicalizada greve já realizada pelos federais em 2012, que arrancou conquistas importantes sob a derrota do governo Dilma-PT. 

Porém, a partir de 2016, com o impeachment de Dilma Rousseff, seguido dos dois anos de Temer-MDB e os quatro anos de ultradireita com Jair Bolsonaro, o PT e a CUT, contando com a capitulação de setores que outrora surgiram no processo de 2004, o PSOL especialmente, foram aos poucos recompondo sua influência em federais.

Embora uma parte do funcionalismo tenha apoiado Bolsonaro em 2018, em rechaço à política petista, é um fato inquestionável que o PT conseguiu retomar a direção política do movimento. Isso se expressou, sobretudo, na eleição de 2022 após a experiência com o governo de ultradireita e o violento ataque ao qual a categoria foi submetida, seja através de uma política de retirada de direitos e cortes no orçamento, mas também pela atuação desastrosa frente à pandemia, que ceifou centenas de vidas de servidores públicos. Frente a essa realidade, os servidores federais apoiaram a eleição de Lula-PT já desde o primeiro turno.

A expectativa dos trabalhadores, evidentemente, era de uma política de valorização do serviço público, recomposição das perdas históricas e reestruturação das carreiras. Todavia, já no primeiro ano, o governo petista demonstrava que não atenderia essas expectativas, concedendo apenas 9% de reajuste (a partir de maio/2023), quando a reivindicação da categoria era de uma reposição emergencial de 26,94%. Importante registrar que o montante previsto no orçamento para essa recomposição foi encaminhado pelo ministro da economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, ainda em 2022. O novo governo petista, portanto, não avançou um milímetro em relação à peça orçamentária original. Nas mesas de negociação, argumentavam, inclusive, que por não ser “o seu orçamento” não teriam como avançar, prometendo melhorias no ano seguinte.

Decepcionados, mas ainda apoiando o governo, que por sua vez contava com a subserviência da maioria das direções das entidades, os servidores engoliram o arrocho salarial sem uma reação mais forte. Contudo, a desconfiança no governo e sua política para o serviço público só aumentaram a partir daí.

Arrocho salarial e reação

Neste ano, apesar das limitações políticas impostas pela burocracia, o Fonasefe (Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais) se viu obrigado a ser mais ofensivo na cobrança de um orçamento que garantisse uma recomposição salarial em patamares mais próximos aos números das perdas históricas. Ainda assim, definiram por maioria – sem o aval da CSP-Conlutas – compor o índice de reposição a partir de 2016 (governos Temer e Bolsonaro), excluindo as perdas dos governos petistas que recuavam até 2010. 

Contudo, apesar de rebaixarem a proposta, o governo a desconsiderou e apresentou uma proposta de reajustes nos benefícios sociais (refeição/alimentação, saúde e creche), decretando zero para os salários em 2024. Propôs ainda duas parcelas de 4,5% para 2025 e 2026, consolidando, desta forma, uma política de acumulação de perdas, uma vez que a inflação de 2023 chegou 4,62% e a expectativa para esse ano, assim como para 2025 e 2026 é de 4,5% ao ano. Ou seja, uma previsão de inflação oficial em torno de 20%, enquanto prevê 9,25% de reajuste.

Ao bater o martelo com REAJUSTE ZERO, o governo acirrou a indignação dos servidores e o descontentamento pressionou as direções nos setores mais pauperizados da categoria, os técnicos administrativos das universidades e institutos federais, a buscarem uma resposta. Ainda que a política dessas direções, no geral, fosse de manter as reivindicações no terreno exclusivo das mesas de negociação permanente, acabaram por ser derrotadas nas plenárias nacionais de Fasubra e Sinasefe. Tiveram que se localizar e chamar a greve para evitar perder o controle da base. Mesmo no ANDES/SN, a política da direção não era de chamar a greve para esse período, ao contrário, no congresso nacional da categoria, propuseram uma resolução genérica de greve sem marcar o período, que foi derrotada por outra proposta de greve ainda no primeiro semestre, apresentada pelos setores de oposição ligados à CSP-Conlutas. Neste momento, na esteira das greves em curso, se viram obrigados a rever sua política, indicando o início da greve no movimento docente para 15 de abril.

Neste momento, a greve é muito forte e radicalizada, e nesse clima foi marcada uma Jornada de Lutas para os dias 16, 17 e 18 de abril com caravanas a Brasília.

Essa greve tem uma importância grande na medida em que se enfrenta com a política e o programa do governo Lula, que se constitui em uma frente ampla para defender os negócios da burguesia. E para isso, ataca os servidores e o serviço público. Não podemos dizer que de conjunto o funcionalismo federal está rompendo com o governo, mas podemos afirmar que os sinais do fim da lua de mel com o PT estão objetivamente expressos nessa luta. Nesse sentido, é preciso avançar na mobilização e ampliar a greve para um movimento geral em federais. Lembrando ainda que, outras categorias, se levantam na educação básica contra o NEM – Novo Ensino Médio e por suas reivindicações, como nas greves de municipais de várias cidades, que também se apresentam nessa conjuntura.

Não à chantagem do PT: construir a unidade para lutar e buscar uma alternativa para a classe trabalhadora

No momento em que fechávamos esse artigo, chegou a notícia de que o governo reafirmou na mesa de negociação (10/04) sua política de reajuste ZERO e ainda exige que as entidades assinem um acordo para garantir as migalhas de recomposição nos benefícios sociais. Ao mesmo tempo, quer impor a fragmentação das negociações por setores e ainda ameaça aqueles que estão em greve de que não haverá nem esse tipo de negociação. Ou seja, o governo Lula/Alckmin chantageia, por um lado, tentando impor o aval das entidades na sua política de arrocho e, por outro, avança em práticas antissindicais, buscando a divisão e enfraquecimento do movimento.

A resposta que os servidores devem dar para esse governo dos poderosos e ricaços é expandir e intensificar a greve. Ou seja, levar ao conjunto dos trabalhadores que apenas sua unidade, força e luta podem derrotar esse governo e sua política de arrocho e desprezo às necessidades e reivindicações dos trabalhadores. Isso começa por fortalecer a Jornada de Lutas de 16 a 18 de abril em Brasília. É preciso intensificar a organização dos ônibus e o recrutamento do maior número possível de ativistas para garantir uma forte presença do funcionalismo na capital federal.

O PSTU está na linha de frente desse importante movimento, atuando com sua militância para avançar na organização da greve e a expansão do movimento, transformando a greve, que hoje está localizada na educação federal, para um movimento nacional e generalizado em todas as categorias do funcionalismo. Para nós, mais do que lutar por suas reivindicações imediatas, é preciso que o movimento questione suas direções e a política de “proteger” um governo que só serve aos interesses da burguesia. É preciso enfrentar com firmeza o governo, denunciando que não atende os servidores, mas garante bilhões para o agronegócio, para o pagamento da dívida pública e subsídio bilionários para empresários nacionais e estrangeiros. O argumento de não haver dinheiro é falacioso. O dinheiro existe, mas está comprometido com os interesses de ricos e poderosos; para os servidores e os trabalhadores em geral é arrocho salarial e reformas que retiram direitos.

O governo Lula é o marionete da burguesia e quem garante os lucros desta às custas do sofrimento e pobreza dos trabalhadores e das trabalhadoras. É necessário avançar na consciência de nossa classe para superar as políticas dos governos burgueses, sejam da direita tradicional, da ultradireita ou de conciliação de classes e amigos da burguesia, como o PT de Lula e suas ramificações. Buscar uma sociedade controlada pelos próprios trabalhadores, revolucionária e socialista, é a única alternativa para tirar os trabalhadores do jugo e da exploração capitalista.