Frente com Lira é contra os trabalhadores e sequer enfrenta a extrema direita
Enquanto fechávamos esta edição, aconteceram as eleições para as presidências da Câmara e do Senado. O atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), principal responsável por garantir governabilidade de Bolsonaro, foi reeleito com uma votação massacrante (464 dos 513 deputados). Resultado da ampla frente em torno ao seu nome, que une do PT ao PL bolsonarista.
Já no Senado, o governo suou um tanto para reeleger Rodrigo Pacheco (PSD-MG), também eleito lá atrás com o apoio de Bolsonaro, que, agora, teve 49 votos contra os 32 dados ao bolsonarista Rogério Marinho (PL-RN).
Para assegurar a vitória do novo aliado, o governo abriu a carteira para liberar cargos e vantagens. Contou com a ajuda, inclusive, do ex-senador e governador de Roraima, Romero Jucá (MDB), conhecido aliado dos garimpeiros e que já foi apelidado como “o maior inimigo dos povos indígenas” no país.
Uma imagem bastante ilustrativa dessa frente dos “de cima” foi a festa dada por Arthur Lira, no dia 26 de janeiro, em sua mansão em Brasília. O convescote juntou do ministro Flávio Dino à deputada petista Maria do Rosário (PT-RS), passando pelo filho de Bolsonaro, o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, até os deputados do PSOL, Guilherme Boulos e Érika Hilton.
Embora o PSOL tenha lançado a candidatura de Chico Alencar à Presidência da Câmara contra Lira (na qual teve 21 votos), é difícil justificar a presença num evento como esse. Boulos disse que estava lá reforçando “a convivência democrática”, e Hilton afirmou que foi pedir medidas contra ameaças de mortes que vem recebendo. Mas num jantar?
A que leva essa ‘frentona’?
Qual o problema dessa frente com Lira, o Centrão e até parte da base bolsonarista? Isso expressa uma política de conciliação com a direita mais reacionária, os mesmos setores que estão com o agronegócio, que assassinam indígenas, e que levaram à frente toda a política bolsonarista nos últimos anos.
Lira continuará concentrando um enorme poder em suas mãos, não só com um orçamento astronômico, mas também com o total controle da pauta política do país. Inclusive a possibilidade de abrir ou não processo de impeachment contra o presidente.
Os acordos com o Centrão já estão provocando escândalos no atual governo. O Ministro das Comunicações escolhido por Lula, Juscelino Filho, cota do Centrão, foi pego usando R$ 50 milhões do Orçamento Secreto para asfaltar uma estrada que passa em frente de uma de suas fazendas no Maranhão. Com as eleições do Congresso Nacional, esse pessoal vai tomar, ainda mais, conta dos cofres e os escândalos serão diários.
Mas haveria uma alternativa diferente de entregar os dedos e os anéis ao Centrão? O governo Lula-Alckmin justifica o acordão, afirmando que não há escolha para governar diante da atual correlação de forças. Mas, já vimos, sucessivas vezes, que o caminho da conciliação e dos acordos espúrios só leva a uma direção: a da desmoralização, da decepção e do fortalecimento da oposição, no caso, do bolsonarismo.
Ao invés de apostar em governar atendendo às reivindicações dos trabalhadores e trabalhadoras e se apoiar em sua mobilização, o governo aposta no sentido contrário: se aliar com os mesmos setores que o povo tanto se esforçou para tirar.
Contra o capital
Frente dos ‘de baixo’ contra os ‘de cima’
Existe, sim, uma alternativa. Na verdade, a única capaz de enfrentar a extrema-direita e o bolsonarismo. E ela passa, ao invés da aliança com os “de cima”, com a burguesia e seus representantes corruptos, pela unidade com os “de baixo”: a classe trabalhadora, o povo pobre e os setores mais oprimidos e marginalizados.
Na verdade, essa frente amplíssima, que abarca até bolsonaristas, é consequência da política de conciliação de classes do PT, que busca um governo de unidade com o maior número possível de setores da burguesia. Uma política que já se expressou nas eleições, com a Frente Ampla com Alckmin, Renan Calheiros, a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), a Federação Brasileira dos Bancos (Frebraban) etc. Ou seja, é um reflexo do próprio programa de conciliação do PT.
A classe trabalhadora não pode esperar outra coisa dessa frente senão a continuidade dos ataques aos direitos, ao emprego, aos serviços públicos, aos setores oprimidos e o aprofundamento da entrega do país. O PSOL presta um desserviço ao aceitar se integrar nessa megacoalização com setores corruptos e bolsonaristas, da mesma forma que outros partidos, como o PCB e a Unidade Popular (UP), que, mesmo de fora, dão apoio a esse governo.
A classe trabalhadora precisa apostar na unidade dos “de baixo” contra essa frente dos “de cima”, avançar em sua organização independente e preparar uma forte mobilização por suas reivindicações.
Unidade dos debaixo
Independência de classe para lutar pelas reivindicações dos trabalhadores
A derrota de Bolsonaro nas eleições trouxe um grande alívio para um amplo setor da classe trabalhadora, do povo pobre, da juventude e dos setores historicamente marginalizados. Foi-se um governo disposto a tudo para arrancar até o último fiapo de direito social, entregar o país, dizimar as populações indígenas, promover o racismo, o machismo, a LGBTIfobia e a xenofobia, e, ainda, impor um regime autoritário, que nos impediria até de reclamar, nos organizar e lutar contra isso tudo.
A extrema-direita, porém, está longe de acabar, como vimos na tentativa de golpe de 8 de janeiro. Mais do que isso, todas as condições que permitiram o surgimento do bolsonarismo e o seu ascenso tampouco se foram com Bolsonaro. Muito pelo contrário, a vida da classe trabalhadora e do povo pobre está cada dia mais difícil.
Se é verdade que a inflação está desacelerando, isso ocorre com os preços ainda lá em cima. O desemprego e a precarização, por sua vez, não dão sinais de recuo e os serviços públicos agonizam.
Salário de fome
Reajuste pífio ao salário mínimo
Em 2022, o acumulado da inflação teve um efeito devastador sobre a renda das famílias, principalmente as mais pobres, que gastam uma proporção maior com despesas básicas, como alimentação. O aumento do leite e derivados ficou acima de 22%, assim como da farinha e das massas. O preço das frutas aumentou 24%; dos tubérculos, 40,2%; e das aves e ovos, 8%.
A Equipe de Transição que preparou a gestão do governo Lula-Alckmin após as eleições chegou a prometer um reajuste do salário mínimo para R$ 1.320, um valor ainda irrisório perto das necessidades da população. O Dieese calcula que seriam necessários R$ 6.647 para que o mínimo cumprisse sua obrigação constitucional de garantir a sobrevivência básica de uma família. Mesmo assim, nem isso o novo governo garantiu, deixando o salário nos R$ 1.302, estabelecidos por Bolsonaro.
Junto com o salário mínimo de fome, persiste um verdadeiro exército de trabalhadores sem empregos ou jogados na mais absoluta informalidade, como os trabalhadores de aplicativos. Os números que o levantamento do Instituto Latinoamericano de Estudos Socioeconômicos (Ilaese) trouxe, em 2022, dão uma dimensão dessa situação: são 58,8 milhões de desempregados, mais que os 44,1 milhões de trabalhadores com carteira assinada. E R$ 33,3 milhões sobrevivendo no subemprego.
Revogação das reformas
Enquanto isso, o governo Lula-Alckmin continua se recusando a sequer debater a revogação da Reforma Trabalhista, que, desde 2017, ajuda a impulsionar a precarização, que, em português, claro significa a superexploração do trabalho, com o mínimo ou nenhum direito.
Privatizações
As empresas privatizadas, por sua vez, continuam nas mãos do grande capital privado, incluindo a Eletrobrás, vendida através de um processo fraudulento, avalizado pela mesma PwC que ajudou a esconder o roubo bilionário dos donos das Americanas.
O Imposto de Renda é outro tema, já que, neste ano, pela falta de revisão, quem ganha a partir de 1,5 mínimo já leva uma mordida do “Leão”, enquanto as grandes empresas e os bilionários se beneficiam de uma série de isenções.
Tirar Bolsonaro nas eleições foi uma necessidade. Agora, precisamos nos organizar para lutar por emprego, salário, direitos, serviços públicos de qualidade e reverter o processo de entrega do país. Só assim, de fato, será possível derrotar a extrema-direita e mudar a vida da classe trabalhadora e do povo pobre e oprimido.
À luta
Por emprego, salário, direitos e terra
Como o PSTU afirmou no 2º turno das eleições, quando chamou o voto crítico em Lula contra Bolsonaro, a fim de derrotar o candidato da extrema-direita, não podemos depositar confiança alguma num governo aliado aos bilionários, aos banqueiros e aos grandes empresários. A classe trabalhadora precisa se organizar de forma independente, lutando por suas reivindicações e por um projeto seu de país.
É necessário lutar por
Emprego – Redução da jornada de trabalho sem redução de salários, a fim de abrir mais postos. Garantia de emprego a todos e todas, com plenos direitos e carteira assinada.
Salário – Duplicação do salário mínimo, rumo ao mínimo do Dieese.
Imposto de Renda – Isenção para quem ganha até 10 salários mínimos e taxação progressiva para grandes fortunas e as propriedades dos bilionários.
Fim das privatizações e reestatização – Reestatização das empresas entregues ao capital privado, como a Eletrobrás, sob o controle dos trabalhadores, para que atuem de acordo com os interesses da população e não para o lucro de meia dúzia de megainvestidores internacionais. Petrobras 100% estatal, sob controle operário, com o fim do Preço de Paridade Internacional (PPI), que impõe o preço do combustível e do gás, aqui, em dólar, para beneficiar banqueiros estrangeiros.
Reforma agrária e fim do genocídio indígena – Estatização do grande agronegócio, reforma agrária radical, garantindo terra a quem precisa. Demarcação e homologação das terras indígenas e quilombolas, com a prisão dos responsáveis pelo genocídio Yanomami.