Editorial: Entre o discurso e a prática
A última pesquisa do Instituto Quaest mostra uma melhora na avaliação do governo Lula, de 33% para 36%. Parece colaborar para esse resultado uma relativa estabilidade nos empregos e na inflação, ainda que num quadro de precarização crescente e corrosão geral da renda das famílias mais pobres.
Não é coincidência, também, que o crescimento na popularidade ocorra após uma leva de falas, declarações e entrevistas nas quais Lula criticou os bilionários e prometeu não fazer ajuste fiscal em cima dos mais pobres; defendendo, ainda, os investimentos sociais. Dos pesquisados, por exemplo, 90% “concordam” quando Lula afirma que o salário mínimo deve subir acima da inflação. A grande contradição é que, enquanto fala isso, o governo, na prática, propõe e implementa uma política contrária a tudo isso.
Palavras, o vento leva
Na prática, Lula vem governando com e para os bilionários, o sistema financeiro e os mercados. Impõe o Arcabouço Fiscal, que retira recursos das áreas sociais para o pagamento da dívida aos banqueiros. Mantém isenções e subsídios bilionários às grandes empresas e, ainda, anuncia um Plano Safra recorde ao agronegócio. Além disso, acabou de aprovar a reforma do Ensino Médio, junto com o Centrão e as empresas privadas do setor.
Essa contradição entre o discurso e as práticas do governo vai ficando ainda mais explicita para alguns setores dos trabalhadores. Já sentem isso os servidores públicos federais, que amargam uma defasagem de mais de 26% nos últimos anos, e tiveram de engolir 0% de reajuste este ano. O setor da Educação foi à luta, numa greve mais do que legítima, e foi tratado com truculência e deboche pelo governo.
O governo não toma as medidas necessárias para reverter a profunda desigualdade social e não consegue resolver os problemas que afligem a grande maioria da população. Lula afirma, de forma recorrente, que já fez isso.
Mas, tanto não é assim que os problemas estruturais do Brasil se mantiveram com força, ainda durante os governos do PT e, depois, se agravaram com Temer e Bolsonaro. A própria experiência dos governos anteriores do PT deveria servir de reflexão para demonstrar como é impossível fazer qualquer mudança significativa que não passe por enfrentar os bilionários capitalistas.
Ao manter o capitalismo intacto, o governo ajuda a ultradireita
Ao governar o capitalismo, sem enfrentar os bilionários, mas, pelo contrário, governando com e para eles, o Governo Federal não só não atende as reivindicações dos trabalhadores, como também administra o sistema capitalista e a barbárie da qual a ultradireita se alimenta.
O que pode encerrar esse ciclo infernal em torno de uma sucessão de alternativas burguesas é uma alternativa dos trabalhadores, que tenha independência da burguesia, com um programa revolucionário e socialista que consiga não só derrotar os governos, mas acabar, também, com este sistema de exploração e opressão através de uma revolução socialista.
Eleições e perigosa farsa do mal menor
Estamos a poucos meses das eleições municipais. Setores da esquerda, como o PSOL, defendem uma política de Frente Ampla, para combater o bolsonarismo e a ultradireita. Em São Paulo, chegaram ao cúmulo de incluir um ex-comandante das Rondas Ostensivas Tobias Aguiar, a Rota, na elaboração do programa de Segurança de Guilherme Boulos. É a reedição, de forma cada vez mais rebaixada, de um voto pelo mal menor.
Qual é o problema disso? Foi de mal menor a mal menor que permanecemos afundados nesse fosso de desigualdade social, enquanto o país, cada vez mais submisso ao imperialismo, é um paraíso para banqueiros, especuladores e bilionários. E, ainda, a ultradireita se fortalece. Vimos isso acontecer não só no Brasil, mas também na Argentina, aqui do lado.
Mas, não seria correto nos juntarmos todos nas eleições contra a ultradireita? Primeiro, foi justamente isso que os setores majoritários da esquerda fizeram nos últimos 30 anos, ao redor de Lula e do PT, o que não impediu o crescimento da ultradireita. Muito pelo contrário. Acelerou o processo de desmoralização e a única coisa que impediu, de fato, foi o surgimento de uma alternativa à esquerda, socialista e antissistema, ao bolsonarismo.
Contra a extrema direita, temos que nos unir, na luta, com todos que estejam dispostos. É preciso também unir todos os setores da classe trabalhadora em defesa de nossas reivindicações e isso, necessariamente, bate de frente com o projeto neoliberal social do governo Lula-Alckmin, cujo Arcabouço Fiscal garante o controle do orçamento pelos banqueiros, contra os trabalhadores, como vimos na greve da Educação e, agora, na greve dos trabalhadores do Ibama.
Por exemplo, para lutar contra a precarização dos serviços públicos, precisamos derrotar o Arcabouço Fiscal de Lula. Não há outro caminho.
Independência de classe a serviço da luta pelo socialismo
As eleições, porém, configuram um momento no qual podemos apresentar um projeto de cidade, de país, e um programa para sociedade e a classe trabalhadora. E é preciso apresentar uma alternativa de classe, revolucionária e socialista, que defenda um programa contra os bilionários e o capitalismo, e não uma proposta de “mal menor”, com a benção dos banqueiros e dos grandes empresários, em aliança com o PSDB, o MDB, o Centrão e cia.
Frentes com o PT e a direita podem derrotar, num primeiro momento, o bolsonarismo nas eleições. Mas, ao não atenderem as necessidades dos trabalhadores, elas só fortalecem a extrema direita, mais adiante.
As pré-candidaturas do PSTU têm esse objetivo: apresentar, debater e fortalecer uma alternativa de independência de classe para os trabalhadores, que permita à nossa classe avançar na consciência, organização e capacidade de luta. É uma obrigação dos revolucionários, ainda mais no 1º turno das eleições, apresentar e defender um projeto socialista e revolucionário, um conjunto de medidas que atenda, de fato, às necessidades da ampla maioria da população e que mostre que o caminho para conquistá-las é a mobilização, a organização e um governo dos trabalhadores, que realmente enfrente os bilionários capitalistas, que não só são privilegiados no orçamento, como usurpam toda a riqueza que nós, trabalhadores, produzimos.
As pré-candidaturas do PSTU visam fortalecer uma alternativa revolucionária e socialista para as cidades e para o Brasil, para que os trabalhadores possam mudar esse país de verdade e não serem eternos reféns do mal menor, que longe de derrotar a direita e o sistema que a reproduz, pavimenta o seu caminho.