C.R..L James: Quando negros escravizados tornaram-se os jacobinos negros
No último dia 31 de maio completaram-se 34 anos do falecimento de C.R.L James (1901-1989). Nascido em Trindad e Tobago, no Caribe, James foi militante trotskista de 1932 a 1950, romancista e historiador; sendo notório por uma vasta obra sobre os impactos nefastos da colonização, em especial no continente africano e no Caribe, além de diversas outras elaborações sobre os negros e negras em seu período na Internacional. Em 1939, partes de seu debate com Trotsky sobre a “questão negra” nos Estados Unidos tornaram-se um texto (“The Negro Question”), onde o autor sistematiza diversas particularidades da questão racial e seu lugar na luta revolucionária.
Sua mais famosa obra sem dúvida é Jacobinos Negros, publicado pela primeira vez em 1938. Nela, pela primeira vez, os acontecimentos heroicos da revolução haitiana (1791) foram narrados com a devida proporção que merecem. O Haiti foi a maior revolução das américas, ao menos no século XVIII, quando negros e negras escravizadas, junto mestiços nascidos da opressão imperial francesa, se ergueram e tomaram em suas rédeas o fim da escravidão, culminando na independência do Haiti em relação à França.
A revolução haitiana se espalharia como pólvora na boca de milhões de vidas humanas condenadas à escravidão, e não foram medidos esforços para seu apagamento. Mesmo assim, ela seguiu ao longo dos séculos consequentes sendo rememorada por lutadores no mundo inteiro que viram nos acontecimentos no Haiti o horizonte de uma vida sem opressões, e o terror da burguesia colonial – como José Bonifácio, o patriarca da independência brasileira, que bradava na Câmara em 1823 que era necessário manter a escravidão e os senhores de escravos unidos para o Brasil não se tornar uma “nova São Domingos”
À luz dessa data, são necessárias também pontuações críticas: ainda que mereça todo o reconhecimento pelo pioneirismo, o livro apela diversos momentos para um tom de romance, em especial em torno de Toussaint L´Overture, considerado o “grande general” negro do processo revolucionário.
Sabemos hoje que parte da visão em torno de Toussaint também vem de um projeto construído em torno dos interesses da classe dominante haitiana, que preferia um ex-escravo de dotes extraordinários que reconhecer a notável participação de quilombolas e negros e negras, que já eram trazidos na África experimentados nas lutas contra os impérios europeus, que também avançavam na exploração do outro lado do oceano, e nunca tiveram a menor disposição para negociar saída alguma com os (então) colonos e latifundiários locais. Diferente de Toussaint, que, entre o quase infinito rol de qualidades listadas na obra, estava em ser um excelente mediador e pessoa de fino trato político.
De maneira alguma James teria realizado essas análises de propósito, tendo o próprio reconhecido alguns de seus erros em um preâmbulo sobre o livro em 1980 (disponível no site Marxists.org). Como homem de seu tempo, C.R.L James teve as limitações de ser talvez o primeiro autor (famoso) em sua época a tornar as lutas no Haiti em um exemplo a ser seguido, e tem o mérito de tornar o evento uma das grandes fontes de discussões sobre a luta contra o racismo e o ainda atual genocídio contra a população preta.
Mais do que apenas um livro, Jacobinos Negros é uma poderosa ferramenta para o engajamento revolucionário em torno da luta contra o capitalismo, e é indispensável para entendermos que a luta contra o racismo deve sim ser levada até as últimas consequências.