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Análise: Boulos gira a campanha ainda mais para a direita

Joana Salay, de Portugal

12 de outubro de 2024
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Boulos e Marta Suplicy Foto: Leandro Paiv

Boulos, candidato do PSOL/Rede à prefeitura de São Paulo em coligação com a federação do PT (PT, PCdoB e PV), chegou ao segundo turno por 56.853 votos, numa das disputas mais acirradas da cidade de São Paulo.

Em sua batalha pela vaga no segundo turno, Guilherme Boulos vestiu a camisa de candidato e tirou a de ativista, abrindo mão de diversas pautas do movimento, como a defesa da legalização das drogas, ampliação do direito ao aborto, a luta contra as privatizações e até a luta pelo despejo zero. A intenção era declarada: para ganhar as eleições é necessário acenar ao centro e demonstrar “responsabilidade”. No segundo turno o candidato intensifica a sua adaptação em busca da vitória eleitoral.

Nós do PSTU chamamos voto em Boulos no segundo turno, porque nos somamos a todos que querem derrotar Nunes eleitoralmente nessas eleições, mas queremos discutir e apontar os limites da estratégia que Boulos adota.

O projeto de Boulos como cópia de Lula

A estratégia “Boulos Paz e Amor” não é uma inovação do candidato, é uma reprodução do que garantiu a entrada do PT no Governo Federal, com a famosa “Carta ao povo brasileiro”, onde Lula acena aos banqueiros que “respeitaria” os acordos nacionais e internacionais. Pois, apesar de todas as concessões que Lula já tinha feito programaticamente, era necessário ainda mais para ganhar a confiança da burguesia. Não à toa, os seus governos foram os que mais garantiram lucros aos bancos, como ele mesmo gosta de afirmar.

Em sua campanha de 2002, Lula contou com o apoio até de Malafaia, bolsonarista ávido hoje, mas que na altura defendia que a igreja não deveria participar de política. Sabemos as consequências política da bancada evangélica hoje e a sua relação direta com as pautas reacionárias do Bolsonarismo.

Os governos federais de Lula e Dilma foram consequentes com suas alianças e fizeram um governo de gestão do capitalismo, garantindo as medidas necessárias, mesmo contra os trabalhadores, como a reforma da Previdência de 2003. Também deram força para o aumento da repressão policial e do genocídio negro, com o acirrar da guerra às drogas e a lei antiterrorismo, que a extrema direita defende intensificar, mas é importante lembrar o papel do PT nessa história.

O terceiro governo de Lula agora é marcado por alianças bastante amplas para garantir a governabilidade, se não bastasse ter Alckmin como vice, Lula governa com pessoas como Arthur Lira e Múcio. E nas eleições municipais os partidos que compõe os ministérios do Governo Lula, fizeram mais alianças com o PL do que com o PT, o próprio PT fez aliança com o PL em 85 cidades. Lula hoje dá um valor recorde para o agronegócio, principal responsável pelas queimadas no Brasil e também pelo financiamento do bolsonarismo. Não há dúvidas de que os governos do PT e a extrema direita são fenômemos distintos, mas que se retroalimentam.

No segundo turno, Boulos amplia para o campo “democrático e popular”

Agora no segundo turno, Boulos tem o desafio de aumentar pelos menos 17% nas intenções de voto para ganhar as eleições. Em entrevista à CNN, o coordenador de campanha de Boulos, indica que pretendem expandir mais, buscando o apoio do “campo popular e democrático”, por isso, acolheram o programa de Tábata Amaral do jovem empreendedor.

Gerar a ilusão na saída individual como forma de atenuar a desesperança dos jovens na periferia foi o centro da política de Pablo de Marçal nas eleições, mas não é um programa exclusivamente seu. De uma maneira ou de outra, Tábata, o PT e também o PSOL, acabam por alimentar a ideia de que se você se esforçar bastante poderá prosperar. Essa ideologia não só é um beco sem saída no capitalismo, como desagrega a classe trabalhadora e a juventude, orientando para projetos individuais e não coletivos.

A busca por votos vai tão longe, que Boulos dialoga com a base eleitoral de Marçal, dizendo que vai incorporar propostas e fazendo um discurso de que os votos de Marçal são uma desesperança com a própria política, representada por Nunes nessas eleições. O que Boulos esquece é que a “política” é também, e principalmente, o governo Federal do PT, que ele representa em São Paulo.

Há uma esquerda, capitalista, que aponta como horizonte reformas no próprio capitalismo em aliança com a burguesia. Isso, combinado com a utilização da extrema direita como ameaça eleitoral, leva ao vale tudo para eleger. O problema é que a crise do capitalismo é a responsável tanto pela grave crise social que vivemos hoje, como também pelo crescimento da extrema direita, que se alimenta da desilusão para defender propostas reacionários e bonapartistas. E quanto mais desilusão geram as experiências com a esquerda capitalista, mais a extrema direita cresce. Como vimos, a eleição de Lula em 2022, não impediu a extrema direita de crescer nessas eleições municipais, derrotou Bolsonaro eleitoralmente, mas não o bolsonarismo como força política.

Por isso, votamos em Boulos nessas eleições, mas sem nenhuma confiança em seu projeto político ou num futuro governo seu. Porque, para derrotar Nunes e o bolsonarismo, pra valer e responder às necessidades da classe trabalhadora em São Paulo, é só com uma independência de classe para enfrentar os interesses dos grandes bilionários.

É necessário mobilizar e organizar a classe trabalhadora, a juventude e o povo pobre de forma independente dos capitalistas e seus governos, além de construir uma oposição de esquerda, classista e socialista ao Governo de Nunes, Tarcísio e também de Lula. É necessário construir uma alternativa revolucionária e socialista, que combata a extrema direita e os capitalistas, que não abra mão dos interesses da nossa classe em nome da viabilidade eleitoral.

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