Nacional

As manifestações golpistas, as Forças Armadas e o governo Lula

Mariucha Fontana

13 de dezembro de 2022
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Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil

O silêncio de Bolsonaro por mais de 40 dias foi uma forma de apoio contundente às manifestações em defesa de um golpe militar e, ao mesmo tempo, evitar em ser preso. Primeiro, seus militantes bloquearam estradas, com a conivência e até apoio explícito de militares da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Depois, se voltaram para acampamentos coordenados nas portas dos quartéis.

Tanto o bloqueio das estradas, quanto os “patriotas” que reclamam por “intervenção Federal” e não aceitam o resultado eleitoral, são financiados por setores da burguesia, recebem o apoio político do governo, do Ministério da Defesa, de militares da reserva e da ativa e, ainda, contam com a conivência da cúpula das Forças Armadas (FFAA).

Não por acaso, o general Braga Netto, vice de Bolsonaro, consolou uma manifestante golpista em Brasília, lhe dizendo “não perca a fé”. Já o ex-comandante do Exército, General Villas Boas,  após as eleições, falou no no Twitter em “atentados contra a democracia”, por parte do Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), destacando que “a população segue aglomerada em frente aos quartéis pedindo socorro às Forças Armadas”, em nítido apoio às manifestações golpistas.

Em 29 de novembro, Ronaldo Travassos, sargento da ativa, da Marinha, hoje lotado no Gabinete de Segurança Institucional (GSI), comandado pelo General Heleno, declarou que “Lula não sobe a rampa”, incentivando ações no dia da posse de Lula.

As FFAA, depois de “fiscalizarem as eleições”, coisa que já não é da sua alçada, produziram um relatório que não conseguiu comprovar fraude alguma. Mas fizeram questão de emitir uma mensagem dúbia, de que haveria “risco hipotético” de fraude, para alimentar a militância golpista.

Além disso, os comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica ainda ameaçaram deixar os cargos antes da posse de Lula, para não ter de lhe prestar continência, num ato de insubordinação e “protesto” contra o eleito e, de fato, em apoio a Bolsonaro.

Impunidade

Herança autoritária botando as manguinhas de fora

O Brasil saiu de 21 anos de ditadura, com todos seus horrores, garantindo impunidade total aos seus crimes. Ao contrário da Argentina, do Uruguai e do Paraguai, deixou as FFAA intactas, assim como sua “doutrina” autoritária, seus privilégios e suas benesses.

A Constituição de 1988 carrega um entulho autoritário e negociou com os militares o Artigo 142, que eles interpretam como querem; ou seja, afirmando que este lhes conferiria um “poder moderador”. Assim, estariam acima dos três poderes da República, para “garantir a lei e a ordem”.

Nas escolas militares se ensina uma “História do Brasil” às avessas, onde o golpe militar de 1964, a contrarrevolução, é comemorada como uma “revolução” e a ditadura, como “defesa da democracia”. Onde torturadores, como Brilhante Ustra, são tratados como heróis.

A crise capitalista que assola o país, a enorme decadência, resultado da subordinação do Brasil ao imperialismo e a desindustrialização a que está submetido, permitiram o fermento social para que, agora, estes setores militares botem as manguinhas de fora.

Bolsonaro nomeou 8.000 militares para cargos executivos; deu benesses para as cúpulas das FFAA na Reforma da Previdência; buscou centralizar, em nível federal, as Polícias Militares; além de estimular e armar 900 mil colecionadores, atiradores e caçadores (CACs).

Ameaças

Não vai ter golpe, mas há chantagem de golpe

Não haverá golpe militar porque não há correlação de forças entre as classes para que, hoje, haja um golpe.

A burguesia e o imperialismo estão divididos, mas têm uma maioria categórica contra o golpe. Um golpe, neste momento, não teria apoio na maioria da população, nem no proletariado nem mesmo na maioria da classe média, onde se encontra o grosso dos apoiadores de Bolsonaro. Mas, a extrema direita, incluindo uma parte das FFAA, faz chantagem de golpe, impunemente, e seguirá fazendo.

Política do governo Lula é de capitulação

O governo Lula, de Frente Ampla com a burguesia, fala em “pacificação” e muitos ativistas acreditam que ele não pode fazer ou falar outra coisa, porque, supostamente, “não teria correlação de forças”.

Ocorre que o PT, as centrais sindicais e os movimentos sociais fazem parte da “correlação de forças”. Enquanto Bolsonaro mobiliza um setor de extrema direita, o PT (e também o PSOL e organizações similares) se propõe a ser um governo burguês, para administrar o capitalismo em crise, e chama a classe trabalhadora e o povo à desmobilização e a confiar no STF, no Congresso, no novo ministro da Defesa e nas próprias FFAA.

Lula nomeou José Múcio Monteiro como Ministro da Defesa, um ex-ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) e ex-deputado dos partidos que apoiaram a ditadura, porque ele é “aceito” pelos militares. Da mesma maneira que nomeará os chefes das diferentes Forças, baseado no critério de “antiguidade”.

Além disso, não está nítido se haverá investigação profunda e punição exemplar para Bolsonaro e seus familiares diante das inúmeras denúncias perante a pandemia, os muitos casos corrupção e as ameaças golpistas.

Independência

A classe trabalhadora deve confiar nas suas próprias forças

No segundo turno, o PSTU chamou o voto crítico em Lula para derrotar, eleitoralmente, Bolsonaro; mas alertávamos que a classe trabalhadora não deveria depositar confiança alguma no governo Lula e que seria preciso existir uma oposição de independência de classe ao mesmo.

Alertávamos que, ao governar o capitalismo, o governo de Lula atacará os trabalhadores e nem mesmo combaterá, de forma consequente, a ultradireita. Pois, a derrota da extrema direita exige mobilização independente dos trabalhadores e autodefesa; bem como a mudança das condições sociais que deram, e dão, base ao bolsonarismo, o que exige enfrentar o imperialismo, os banqueiros, as multinacionais e os grandes ruralistas do agronegócio.

A classe trabalhadora deve buscar sua organização independente da burguesia, a sua mobilização unificada pelas nossas reivindicações e confiar nas suas próprias forças.