Meio ambiente

Amazonas: A crise ambiental é racista e a saída é socialista

Eudes Melo, professor de sociologia e militante do PSTU Amazonas

20 de dezembro de 2024
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Ano passado, Manaus liderou o ranking de capitais com mais ocorrências de desastres naturais segundo o Cemaden | Foto: Reprodução/TV A Crítica

O capitalismo está levando o mundo a um colapso ambiental. A crise ambiental é parte da materialização da decadência global, mas também do imperialismo capitalista e de seu arcabouço de superexploração do trabalho. Que ataca os direitos dos trabalhadores em todo os continentes.

Os governos capitalistas, em todos os países, vêm emplacando medidas de degradação do trabalho no setor privado da economia internacional, ao mesmo tempo que atacam o serviço público e desestruturam a segurança do trabalho dos servidores públicos.

Aqui no Brasil, Lula está encaminhando a reforma Administrativa com a finalidade de desmontar as regras que definem direitos fundamentais dos servidores públicos, bem como seus salários. Em nosso país, os salários do proletariado seguem sendo mitigados constantemente. Sem embargo, as taxas de água e luz e a temperatura do tempo continuam aumentando.

A crise ambiental é racista

Negros e negras vem sofrendo os ataques da exploração burguesa desde o processo colonial em toda a América. Antes, na condição de mão de obra escrava. Agora, como força de trabalho assalariado, com os salários mais baixos do mercado e com o maior nível de exploração e precarização do trabalho.

Historicamente, os trabalhadores negros e as trabalhadoras negras são as maiores vítimas da degradação ambiental. São esses trabalhadores que estão constantemente sendo afetados pelos deslizamentos de terras, pelas enchentes, pelas estiagens. Moram em bairros sem saneamento básico nenhum, com risco constante de desabamento, de alagamento. Alguns são lugares de despejos de resíduos tóxicos.

Muito destes bairros não tem água potável e coleta de lixo. Esses trabalhadores estão frequentemente sob ação de despejo e expulsão de terras urbanas e rurais que as ocupam para morar e trabalhar. Pior, são tratados como vagabundos e criminosos, somente porque lutam pelo direito a um pedaço de terra para morar ou para cultivar.

A indústria capitalista representa um enorme repertório de tragédias ambientais em todo o mundo, como a radiação em Chernobyl, Ucrânia, em 1986; o vazamento de agrotóxicos em Bhopal, na Índia, em 1984; o derramamento de petróleo do navio Exxon Valdez, em 1989; a explosão da plataforma Deepwater Horizon, no Golfo do México, em 2010; a explosão dos poços de petróleo, no Kuwait em 1991; a tragédia de Brumadinho e Mariana, em 2015; as secas históricas do rio Amazonas, em 2023/2024; a tragédia do Rio Grande do Sul, também neste 2024; nos constantes deslizamentos e enxurradas nas grandes cidades brasileiras.

Somente este ano, de acordo com o INPE, foram registrados 25.154 focos de queimadas no Amazonas | Foto: Nilmar Lage/Greenpeace

A crise ambiental castiga os mais pobres e não brancos

Em todo o mundo, 54 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa são emitidas por ano. De acordo com o INPE/Terra Brasilis, foram registrados 25.154 focos de queimadas no estado do Amazonas, e 257.993 no Brasil. Negros, negras, quilombolas e indígenas são os principais afetados pelas enchentes, estiagens e poluição do ar atmosférico.

O saudoso escritor amazonense Márcio Souza chamava a cidade de Manaus de a cidade do mormaço. A cumplicidade dos governos federal e de Wilson Lima transformaram Manaus na capital da fumaça. As consequências são nefastas para a saúde do povo pobre da cidade, que tem o 5º maior PIB entre as capitais do Brasil, e com um orçamento aproximado de R$ 28 bilhões.

O desmatamento da floresta amazônica segue em ritmo muito elevado e, com ele, a emissão de uma quantidade significativa de gás carbônico. A consequência é o aumento do efeito estufa e o aumento da frequência do fenômeno El Niño. Manaus concentra, de acordo com o IBGE, 2.063.547 de pessoas. O Amazonas é o estado com a maior concentração indígena do país. Manaus é a cidade do país na qual residem 66,9% de pessoas autodeclaradas pardas e mestiças; e 3,1% de pessoas se autodeclaram negras. Se considerarmos o conceito da identificação do IBGE, em relação aos pardos, 70% da população amazonense é formada por negros e negras.

Os mais vulneráveis às consequências e adoecimentos são aqueles que tem endereço nas periferias de Manaus. Trabalham durante o dia inteiro, a maioria na escala 6X1, e retornam à noite para o seu distante bairro, para a sua rua, para o seu beco, para suas casas, seus quartos, suas kitnets, estâncias, para suas palafitas, para seus rip-rapes. Parte destes, 70% de não brancos, também não possui endereço nenhum. São não brancos: negros, negras e indígenas. E tem classe – são trabalhadores e trabalhadoras, que vivem em condições de superexploração pela burguesia de Manaus. E, ao mesmo tempo, estão expostos às elevadas temperatura, ao ar tóxico da atmosfera e às consequências das tempestades e dos maus tempos.

Um estudo realizado por 12 pesquisadores de sete Universidades e instituições brasileiras e portuguesas, dentre elas a Universidade de Lisboa e a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), publicado no periódico científico Plos One, concluiu que entre 2000 e 2018, 48 mil pessoas morreram em decorrência de aumento rigoroso da temperatura no Brasil. Este dado é simbólico de que o capitalismo mata.

De um lado, está a turma que vive em seus bunkers, em suas mansões. Do outro lado estão os trabalhadores, negros, negras e indígenas em situação de vulnerabilidade e exclusão de segurança habitacional, ambiental, sob risco de morte. Muitas famílias com mais de 10 pessoas dividem um único quarto, em moradias precárias etc. [

Estes trabalhadores têm sido vitimados por inúmeras situações de desabamentos, enxurradas, cujas consequências são a perda de seus móveis, roupas e eletrodomésticos, adquiridos com o suor de seu duro trabalho. Quem não se lembra das chuvas de março de 2023, que deixaram a lembrança de muita destruição, além de 224 pessoas desabrigadas em bairros e comunidades como a da Sharp, Zumbi, na Zona Leste? No Igarapé do 40, casas foram arrastadas.  Além do deslizamento de terra no bairro Jorge Teixeira, quando na ocasião morreram oito pessoas.  Não tinha nenhum grande capitalista entre estes.

Essas histórias se repetem todos os anos. Neste sentido, Manaus não é uma cidade irracional, é uma cidade calculada para produzir os lucros da burguesia manauara e das grandes multinacionais.

Por uma saída socialista

O Estado e a prefeitura, governos e prefeitos de turno, vêm negando historicamente um programa para resolver a situação da classe trabalhadora de Manaus e do estado do Amazonas.

Por isso, para indígenas, negros e negras não há uma saída por dentro do sistema capitalista. Não há uma saída pelas instituições do Estado e prefeitura dos capitalistas.

É necessário sim debater sobre os problemas ambientais, sobre a situação de insalubridade e vulnerabilidade na qual vivem milhões de trabalhadores de todo o nosso estado. No entanto, é necessário fazermos uma reflexão sobre as políticas públicas para resolver a segurança habitacional, o saneamento básico, a qualidade dos transportes públicos etc. Mais que isso, precisamos transcender sobre nossas reflexões.

Precisamos apontar os caminhos e a saída para a esses problemas. Somente com a auto-organização da nossa classe teremos força para apontar um programa ambiental. Para superar o racismo ambiental é necessário auto-organização da classe que produz a riqueza do nosso estado e da nossa cidade para superar o sistema capitalista.

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