Mulheres

Além de tudo, o “PL do Estupro” também é racista

Flávia Bischain, de São Paulo (SP) and Israel Luz

18 de junho de 2024
star4.92 (12 avaliações)
São Paulo SP 15/06/202 Ato no MASP contra o Projeto de Lei (PL) 1.904/24, que equipara o aborto de gestação acima de 22 semanas ao homicídio. Foto Paulo Pinto/Agência Brasil

O Projeto de Lei (PL) 1904/2024, além de tudo, é racista. Ao equiparar, legalmente, o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) propõe, na prática, penalizar mulheres negras e periféricas. Isso é fácil de concluir quando se vê os registros de violência sexual no Brasil.

De acordo com o boletim “Notificações de violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil, 2015 a 2021”, publicado em fevereiro de 2024 pelo Ministério da Saúde, 60,3% dos casos envolvem meninas negras de 10 a 19 anos. O estupro é o principal tipo de crime cometido contra nossas jovens, em geral por pessoas próximas e no ambiente doméstico.

Já a Pesquisa Nacional do Aborto/2021, coordenada pela antropóloga Debora Diniz, da Universidade de Brasília (UnB), ampliando o levantamento para mulheres de todas as idades, detectou que dentre as mulheres que abortaram pelo menos uma vez, 74% são negras.

Diante desses fatos, o Projeto de Lei, encampado por religiosos extremistas e bolsonaristas, se revela como mais uma face da guerra racista aos “de baixo”, particularmente às crianças, mulheres e pessoas com útero neste caso.

Não podemos permitir que transformem vítimas em criminosas

Não será uma pena. Será uma medida socioeducativa. Ela pode fazer um atendimento socioeducacional para que isso não volte a acontecer”, disse o bolsonarista na GloboNews nesta semana. Ou seja, para o deputado a vítima também é culpada, como fica evidente em suas próprias palavras.

Esta é a mesma lógica reacionária que responsabiliza uma mãe negra pela prisão ou morte de seu filho nas mãos da polícia. Por que ela o deixou ir para o baile? Por que permitiu andar com as “pessoas erradas”? Por que não foi mais cuidadosa?

Nenhum questionamento é feito ao Estado burguês assassino. Todos se dirigem às vítimas. Há uma condenação na prática.

Ao tentarem obrigar crianças que já passaram por um profundo trauma e um sofrimento inominável a cumprirem o papel de mães, função que jamais deveria ser sua, esses canalhas provam que, entre as vidas que tanto dizem defender, não estão as negras e periféricas.

Quando se fala em genocídio, é preciso lembrar que ele tem múltiplas faces. A ação das forças de “segurança” é indisfarçável como mecanismo dessa engrenagem capitalista. Outras expressões são projetos de lei como este, na medida em que oferecem à população negra um horizonte de mais criminalização e encarceramento.

Por isso, derrubar o “PL do Estupro” também é uma tarefa urgente da luta antirracista no Brasil.

Leia também

Organizar a luta contra o PL 1904/24 que equipara o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio!