Sabesp: Em escandalosa negociata, Tarcísio entrega a água e o saneamento a banqueiros e fundos estrangeiros
Empresa do banqueiro Daniel Dantas foi a mesma que deixou gaúchos no escuro
Sob uma chuva de papéis picados, o governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas (Republicanos), comemorou, nesta terça-feira, 23, na B3 (antiga Bovespa), a mais escandalosa negociata privatista do estado, ou até mesmo do país.
A privatização da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) une a entrega de um patrimônio público, responsável por um serviço essencial, a grandes grupos privados e estrangeiros; o favorecimento escancarado a uma concessionária reconhecida por sugar até o bagaço serviços públicos em outros estados; o prejuízo bilionário devido ao rebaixamento do valor da companhia; e até corrupção pura e simples.
Uma verdadeira roubalheira que coloca nas mãos de grandes grupos financeiros privados uma das maiores empresas de água e saneamento da América Latina, altamente lucrativa, às custas da vida e da saúde do povo paulista.
Tenebrosas transações
Empresa de capital misto, mas ainda controlada pelo governo de São Paulo, a Sabesp foi entregue ao capital privado através da venda de ações do estado, que reduziu sua participação acionária de 50% para apenas 18%. Com as ações vendidas por um valor 18% abaixo do que era cotado na bolsa, essa transação já representou, de cara, um prejuízo de R$ 4,5 bilhões aos cofres públicos.
A única empresa que participou da disputa pelo controle da Sabesp, ou “investidor de referência”, numa venda totalmente direcionada, foi a Equatorial Energia, empresa do ramo de distribuição de energia que amealhou 15% das ações da estatal. Outros 17% foram para fundos e grandes investidores, inclusive estrangeiros.
A nomeação da presidente do Conselho de Administração da Sabesp, Karla Bertocco, em maio de 2023, por sua vez, indica que o processo de venda da estatal foi um jogo de cartas marcadas. Isso porque Bertocco ocupava, até dezembro do ano passado, o Conselho da Equatorial, acumulando os dois cargos, ou preparando, desde dentro, a Sabesp para a privatização.
Equatorial: Exploração predatória dos serviços públicos
A Equatorial é uma empresa que atua majoritariamente no ramo de distribuição de energia e tem como maior acionista o banco Opportunity, de Daniel Dantas. Também fazem parte da composição acionária da empresa fundos estrangeiros, como o Capital World Investors e o maior grupo financeiro do mundo, a BlackRock. Seu presidente, Augusto Miranda, declarou à imprensa que a empresa traz “ampla experiência de operar ativos de infraestrutura”. Que o diga a população que vive sob a égide do grupo, como os goianos ou os gaúchos. A Equatorial Goiás figura no ranking da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) como a pior empresa dentre as 29 grandes concessionárias de distribuição de energia em 2023, período que deixou os goianos por 21h e 34 minutos sem energia elétrica, num total de 11 interrupções do sistema, o dobro permitido. Sua atuação no Rio Grande do Sul, Maranhão e Pará também não é muito melhor.
Um gerenciamento que se mostrou desastroso durante as enchentes do Rio Grande do Sul. Após a privatização da CEE, agora CEE Equatorial, em 2021, a empresa que opera na capital Porto Alegre, no litoral e sul do estado, promoveu um drástico enxugamento do quadro de funcionários, de 46%, sem investimentos e com uma precarização dos serviços que deixou milhares de gaúchos no escuro no início do ano. Mesmo antes dos eventos climáticos no sul, as reclamações de interrupção de energia, demora no atendimento e cobranças abusivas eram recorrentes.
Não é difícil entender a razão disso. Em relatório interno divulgado no dia 2 de julho a investidores, a empresa traça seus planos para a Sabesp: “redefinir” a relação com sindicatos, impor uma “cultura de dono”, reduzir custos com enxugamento de funcionários por meio de um plano de demissão voluntária, e, principalmente, o aumento da distribuição de dividendos (a parte dos lucros repartida entre os acionistas). Como exemplo do sucesso dos PDV’s abertos pela empresa, o relatório cita a adesão aos programas abertos no Pará, Piauí e Alagoas.
“Os dados nos mostram que, mesmo com a empresa lucrativa, ainda podem ser proporcionadas economias na linha de despesas com pessoas, semelhantemente ao que estamos observando nas evoluções da Eletrobras e Copel recém-privatizadas”, cita o documento, repercutido pelo jornal Folha de S. Paulo.
Isso expõe o modus operandi da Equatorial: a exploração predatória das concessões públicas a fim de sugar o máximo de lucro através da deterioração do serviço à população. Se os gaúchos ficaram sem luz, agora os paulistas estão ameaçados de ficar sem água.
A farsa da universalização do saneamento básico
Uma das maiores farsas apregoadas por Tarcísio é a de que a venda da Sabesp vai agilizar a universalização do saneamento básico no estado. O que ele não diz é que, hoje, dos 375 municípios atendidos pela companhia, 305 já contam com saneamento universalizado, e que parte dos investimentos necessários para a cobertura completa, avaliados em R$ 70 bilhões, virá não dos bolsos de Daniel Dantas ou do cofre da BlackRock, mas de um fundo público. Isso mesmo, o Fundo de Apoio à Universalização dos Serviços de Água e Esgoto de São Paulo (Fausp) contará com 30% dos R$ 4,4 bilhões arrecadados com a venda da Sabesp, além dos dividendos que virão com as ações que o estado preservou, e servirá para custear os novos investimentos.
Isso significa que o governo paulista vendeu a Sabesp a preço de banana, e ainda por cima continuará financiando a empresa com os próprios recursos da privatização, e dos lucros das ações que restaram. Essa é a contrapartida da negociata privatista de Tarcísio: o estado entra com a maior empresa de saneamento do país, e uma das maiores do mundo, e a concessão de um serviço essencial que é o saneamento e a água do povo, e a Equatorial, assim como os demais fundos privados e estrangeiros, entram com a difícil função de receber seus lucros no conforto de seus escritórios em Miami ou Nova Iorque.