RS | Austeridade fiscal e dinheiro para o agro: Governo Lula também tem sua responsabilidade
O governo Lula também tem sua responsabilidade na tragédia, ao aplicar a austeridade fiscal e promover as privatizações. O orçamento federal de 2023 para a Gestão de Riscos e Desastres foi o menor em 14 anos: o governo destinou R$ 1,05 bilhão para lidar com as consequências de desastres e somente R$ 36 milhões para tentar evitar os problemas.
O restante do dinheiro foi para os banqueiros, através do Arcabouço Fiscal. Vale lembrar que, só no ano passado, Lula destinou 43% de todo o orçamento federal para o pagamento da ilegítima dívida pública.
Além disso, o governo financia a expansão do agro e seu rastro de destruição. Por exemplo, os R$ 364 bilhões, através do “Plano Safra”, em 2023 – o maior orçamento da História – vai servir, dentre outras coisas, para financiar as ações do agronegócio que promovem a destruição dos biomas, particularmente da Amazônia e do Cerrado.
Ao mesmo tempo, toda essa destruição acaba alterando o regime de chuvas no Brasil, causando secas no Sudeste e no Centro-Oeste e, consequentemente, quebras de safras, como ocorreu no ano passado, e excesso de chuvas, na região Sul. Ou seja, o modelo de agricultura capitalista é tão irracional que ameaça as regiões de maior produção do próprio setor.
Antiambientalismo
Ultradireita: uma enxurrada de fake news e negacionismo
A ultradireita se utiliza da legítima indignação contra os governos para disseminar uma enxurrada de fake news.
Uma delas, divulgada em vídeos, afirmava que caminhões com mantimentos só poderiam entrar no estado com notas fiscais. Outra, dizia que “autoridades” exigem documentação para pilotar botes de resgate. Por isto, também viralizaram vídeos com o “Véio da Havan” e representantes de grandes empresas do agronegócio do estado, que estariam realizando filantropia, enviando água e alimentos para o povo gaúcho.
Uma “influencer” pentecostal, fundamentalista e racista, chegou a afirmar que a culpa pela tragédia é o fato do Rio Grande do Sul ser o estado que concentra a maior quantidade de “terreiros de macumba”. Ou seja, para ela, o sofrimento de milhões não é apenas um “castigo de deus”, mas também uma vingança “de seu deus” contra aqueles cultuados por outros povos.
Outras “fakes” defendem os empresários, apresentando-os como heróis; pois, ao contrário do setor público, seriam eles que estariam organizando e financiando o socorro às vítimas. Outros, ainda, defendem “privatizar” as cidades, para “reconstruir” o estado.
Tentando transformar vilões em vítimas
A narrativa da ultradireita tem objetivos. O primeiro é tentar esconder da população que eles foram, e ainda são, os inimigos do meio ambiente.
Para defender os interesses econômicos do agronegócio, passaram a boiada sobre a legislação ambiental do país e sempre defenderam justamente as medidas que levaram o estado à catástrofe: privatizações do setor público, o fim de qualquer medida de prevenção a desastres e o fim de leis e normas antiecológicas, dentre várias outras. Tudo isto para favorecer seus heróis, os capitalistas destruidores da natureza.
É por isso que eles também defendem o “livre-comércio” e a “livre iniciativa privada”. Querem transformar os vilões em vítimas.
Essa turma também nega o aquecimento global. São os principais divulgadores de estúpidas teorias conspiratórias, promovidas por falsos climatologistas, queridinhos do agro, que até ontem diziam, no Congresso, que as projeções de grandes chuvas no Sul seriam um “exagero” e exemplo de “alarmismo”.
O caso de Nova Orleans
Planos de reconstrução não podem servir para salvar capitalistas
Como sempre, os capitalistas podem tentar tirar vantagens da situação e se aproveitarem da catástrofe para lucrar ainda mais, principalmente à custa dos mais vulneráveis e marginalizados. Foi isto, por exemplo, que aconteceu em Nova Orleans, depois da passagem do Furacão Katrina, em 2005. Aliás, em reuniões com o governador Eduardo Leite, a própria burguesia gaúcha já vem mencionando o “exemplo” de Nova Orleans para reconstrução do estado. Para a “recuperação” da cidade, a prefeitura também anunciou que contratou uma empresa Alvarez & Marsal que prestou a consultoria para Nova Orleans depois do furacão Katrina e também para Minas Gerais depois do rompimento das barragens de Mariana e Brumadinho. Vejamos os resultados de dita consultoria no caso norte-americano.
Antes da catástrofe, Nova Orleans havia passado por uma “terapia de choque” neoliberal. Todo o sistema de diques para conter as inundações da cidade estava em estado precário, sem manutenção. Os serviços de alerta e de socorro diante de um possível desastre também estavam em frangalhos, sem dinheiro, por causa de cortes orçamentários.
Depois da tragédia, o então governo Bush entregou vários contratos (para o socorro das vítimas) a empresas privadas, totalizando US$ 3,5 bilhões (cerca de R$ 18 bilhões). Bush também atendeu aos apelos dos capitalistas e suspendeu leis salariais para os trabalhadores da construção civil, transformou a região afetada em “zona de livre empresa”; ou seja, isenta de impostos e com amplos incentivos fiscais.
Também aproveitaram para fazer uma “reforma do ensino”, que significou a aceleração de planos de privatização da Educação. Em seguida, a destruição de bairros inteiros despertou a cobiça do lobby imobiliário, que aproveitou para expulsar a população pobre e negra de muitas regiões e construir condomínios de luxo sobre os escombros de seus bairros e casas.
Como resultado, a proporção de afro-americanos (majoritariamente pobre) em Nova Orleans caiu de 67% (2005) para 59% (2013). Muitos se mudaram para as periferias, expulsos pelo afluxo de uma população branca, jovem e endinheirada.
Reportagem
“Em Guaíba, o cenário é, literalmente, de guerra. Uma grande tristeza”
Basta de capitalismo!
Sem enfrentar o sistema, não há como evitar novas tragédias
Que isso sirva de alerta para o povo do Rio Grande do Sul. Uma catástrofe com essas proporções, devastadora para todo estado, pode servir como oportunidade para que a burguesia lucre em cima da desgraça do povo, principalmente seus setores já mais explorados e oprimidos, através de Parcerias Público-Privadas (PPPs), da corrupção, da especulação imobiliária e das expropriações.
É certo que serão necessário investimentos que envolvem dezenas de bilhões de reais. Não apenas para a reconstrução das casas, de estradas e pontes. Mas, também, para investimentos profundos na infraestrutura de prevenção a novos desastres, que vão acontecer com mais frequência, ao mesmo tempo que será preciso adotar grandes medidas de adaptação às mudanças do clima.
Não bastará reconstruir. Será necessário fazer adequações, levando em conta que novos eventos climáticos extremos voltarão a se manifestar. Como afirmam os técnicos, será necessário mudar cidades inteiras de lugar, principalmente as que, hoje, se localizam em planícies de inundação, encostas ou estão dentro de vales.
E nada disso poderá ser feito se não houver uma mudança profunda na política econômica e na política fiscal de todos os governos. Nada disso poderá ser feito sem enfrentarmos os interesses dos capitalistas do nosso país.
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