RS: Enxurradas provocam mortes e evidenciam catástrofe climática
Chove no Rio Grande do Sul, desde 27 de abril. Já são 265 municípios atingidos, com pontes caídas, alagamentos, deslizamentos de encostas e estradas bloqueadas, segundo a Defesa Civil.
Dados atualizados hoje (3/5), mostram que ao menos 24.080 pessoas desalojadas, 8.168 em abrigos, 56 pessoas feridas, 74 estão desaparecidas e 39 mortes foram registradas. A estimativa é de que 351.639 moradores tenham sido afetados pelas fortes chuvas.
Segundo o governo do Rio Grande do Sul, tem mais de mil imóveis sem energia elétrica. Há 541 mil pessoas sem acesso à água, 86 municípios sem telefone nem internet, 210 escolas danificadas. As aulas foram suspensas nas 2.338 escolas da rede estadual. Na rodovias, às 18h desta sexta-feira, eram 136 trechos em 68 delas, com bloqueios totais e parciais, entre estradas e pontes.
Na capital Porto Alegre, o nível do lago Guaíba já atingiu 4,5 metros, (podendo subir ainda mais), enquanto a cota de alerta e de inundação são, respectivamente, de 2,50 m e de 3,0 m. As réguas do sistema de medição da prefeitura se perderam com as correntezas. O Cais Mauá está inundado e uma comporta (de número 14, da avenida Sertório) se rompeu. Parte do centro da cidade já está alagado, sem falar nas Regiões da Ilhas que se alagaram bem antes, afetando moradores.
Atualização
Sobe para 90 o número de mortos e há um total de 132 desaparecidos
Até agora, é maior catástrofe causada por eventos climáticos extremos
É o terceiro período de fortes chuvas desde o ano passado. Em novembro de 2023, houve cinco mortes e, em setembro, outras 50. Dessa vez, a região central do estado, bastante urbanizada, foi muito atingida. É uma área onde há uma grande concentração de córregos e rios, assim como muitas estradas e pontes, o que faz com que esta seja a maior catástrofe em consequência de eventos climáticos.
Além disso, no dia 2 de maio, a barragem da Usina Hidrelétrica 14 de julho, localizada entre os municípios de Cotiporã e Bento Gonçalves, não suportou o grande acúmulo de água das chuvas e acabou rompendo parcialmente.
A tendência para os próximos dias é de agravamento da crise, pois muitas pontes e rodovias estão destruídas ou bloqueadas, impedindo o abastecimento de muitas cidades do interior.
Os maiores vitimados são os mais vulneráveis
As vítimas se repetem. Muitas delas já tiveram suas casas, carros e pequenos negócios inundados e soterrados pela terceira vez em poucos meses. E, pior, são os mesmos que choram os seus familiares e vizinhos mortos. Tragédias que poderiam ser evitadas, caso houvesse políticas preventivas, ao invés de tanta especulação imobiliária.
Chuvas, cheias e deslizamentos, no entanto, não afetam toda a população de forma igual. As mais afetadas são as pessoas pobres, que vivem nas chamadas áreas de risco e sofrem com a falta de moradia, de saneamento básico e de trabalho.
Agora, como nas tragédias anteriores, o enredo é o mesmo: governador, prefeito, ministros e o presidente sobrevoam as áreas atingidas; oferecem recursos emergenciais para minimizar uma pequena parcela da destruição; mas os problemas de fundo, e que provocam tanta morte e destruição, não são tratados.
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AUSTERIDADE FISCAL
Catástrofe climática se combina com tragédia social
É verdade que a crise climática tem piorado, por culpa dos capitalistas que lançaram toneladas de gases de efeito estuda na atmosfera. O resultado é que 2023 foi o ano mais quente dos últimos 125 mil anos, enquanto a concentração de dióxido de carbono (CO2) é a maior dos últimos 800 mil anos, segundo dados científicos. O aquecimento global faz com que os eventos climáticos sejam mais intensos e frequentes. Isso explica as chuvas torrenciais que atingiram o estado.
Mas, também é verdade que a crise climática provocada pelo capitalismo se combina com a tragédia social provocada pelos governantes. Mesmo em tempos “normais”, os governos (municipais, estaduais e federal) não são capazes de dar condições dignas de moradia à população. Eles atendem aos interesses da especulação imobiliária, que financia as suas campanhas eleitorais, enquanto os mais pobres e vulneráveis são empurrados para as áreas de risco.
Austeridade fiscal impende investimentos em prevenção
A tragédia social se agrava com a austeridade fiscal e com as privatizações. O orçamento federal de 2023 para a Gestão de Riscos e Desastres foi o menor em 14 anos. De 2013 a 2022, os sucessivos governos destinaram R$ 19,9 bilhões para o setor.
Só 31% deste total, contudo, foram investidos em iniciativas de prevenção; enquanto 69% foram usados em medidas de socorro, assistência às populações vitimadas, restabelecimento de serviços essenciais (água, cestas básicas, itens de higiene e limpeza urbana) e reconstrução de locais destruídos. O restante do dinheiro vai para os banqueiros, garantido pelo Arcabouço Fiscal. Vale lembrar que Lula destinou 43% de todo o orçamento federal para o pagamento da ilegítima dívida pública, ano passado.
Essa é mesma lógica do orçamento da União é aplicada nos estados e municípios. A desculpa é sempre a mesma: “não tem dinheiro”. Enquanto isso, o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) das grandes propriedades e daquelas destinadas à especulação imobiliária é baixo. Em 2023, o governador Eduardo Leite (PSDB) pagou R$ 2 bilhões da alegada dívida do estado com a União e, mesmo assim, a dívida saltou de R$ 82,4 bilhões para R$ 92,8 bilhões.
Privatizações agravam a tragédia social
Há meses, o estado vem sofrendo com as chuvas, mas nenhuma medida de prevenção foi tomada, como contenção de encostas, drenagem, construção de barragens e desassoreamento do leito dos rios, estudos de áreas de risco, criação de reservas florestais nas margens dos rios, dentre outras.
Ao contrário, a resposta do governo tem sido a privatização. No estado, a Corsan (companhia responsável pelo fornecimento de água e esgoto para maioria dos municípios) e a CEEE (responsável pelo fornecimento de energia) foram privatizadas recentemente e os efeitos nefastos já podem ser sentidos. Sem investimentos em prevenção, melhoria dos serviços e capacitação dos funcionários, a cada evento climático (que, às vezes, sequer precisa ser muito forte) ficamos sem água e luz.
Nos últimos tempos, tem sido comum que bairros e cidades fiquem dias e até semanas sem luz. Cidades do Sul do estado, como Cerrito, Jaguarão e Pelotas, estão com regiões inteiras sem luz, desde as tempestades de 21 de março, e sem qualquer previsão de volta.
Os prejuízos são enormes, com perdas de alimentos nas residências e pequenos comércios, de medicamentos que necessitam ser armazenados em refrigeradores, sem falar nas dificuldades para o atendimento aos feridos, desabrigados e desalojados. Tudo isso agrava ainda mais a catástrofe atual.
SAÍDA
Programa imediato para enfrentar a catástrofe
— Imediata assistência aos atingidos, restabelecimento de serviços essenciais e reconstrução das residências e locais destruídos;
— É necessário enfrentar a especulação imobiliária, desapropriar residências em áreas seguras que, hoje, só servem para a especulação, para garantir moradias dignas à população pobre, além de reparar os prejuízos dos que já foram atingidos;
— Zerar o déficit habitacional, expropriar os imóveis dos grandes capitalistas, usados para a especulação imobiliária;
— Como parte da solução dos problemas de infraestrutura e reconstrução das casas, estradas e pontes, defendemos o não pagamento da ilegítima da dívida pública. Assim, seria possível financiar um plano estatal de prevenção às mudanças climáticas; como também um plano de obras públicas para reconstrução das casas atingidas e construção de novas residências, para quem vive em área de risco;
— Reestatização da CEEE (eletricidade) e da Corsan (água e esgoto), sem indenização para os empresários e sob controle dos trabalhadores e usuários, para que atendam às necessidades da maioria da população.
O AGRO É DESTRUIÇÃO
Agronegócio amplia crise climática
Se mundo afora a indústria é o maior emissor de gases de efeito estufa, aqui no Brasil o modelo de agricultura capitalista, o agronegócio, é o principal responsável pelas emissões.
Segundo o Sistema de Estimativas de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa (SEEG), em2022, as mudanças de uso da terra (incluindo o desmatamento em todos os biomas brasileiros), respondem por 48% do total nacional de emissões, seguido pela agropecuária, com 27% das emissões do país. Ou seja, o agro, sozinho, emitiu 75% dos gases de efeito estufa no país.
E isso se faz com muita destruição ambiental de biomas, como o Cerrado (a “caixa d’água do Brasil”), do Pantanal e da Amazônia (essencial para regulação do clima no planeta). Essa destruição é financiada pelos governos. Por exemplo, o governo Lula anunciou R$ 364 bilhões, através do Plano Safra, em 2023 – o maior orçamento da história. Todo esse dinheiro vai servir, dentre outras coisas, para financiar a destruição dos biomas, particularmente da Amazônia.
Ao mesmo tempo, toda essa destruição acaba alterando o regime de chuvas no Brasil, causando secas no Sudeste e Centro Oeste e, consequentemente, quebras de safras, como ocorreu no ano passado. Além disso, causam uma intensificação das ondas de calor e produzem chuvas torrenciais no Sul do país. Ou seja, o modelo de agricultura capitalista é tão irracional que ameaça as regiões de maior produção do setor.
CRISE DO CAPITAL
Socialismo ou colapso ambiental
Atualmente, todas as tragédias ditas naturais que ocorrem no mundo são cada vez mais graves. Tudo isto nos dá a dimensão e a urgência de enfrentarmos a catástrofe climática, que passa, obrigatoriamente, por mudanças profundas na forma de produção e relação com a natureza, inclusive atacando o agronegócio.
O PSTU se solidariza com todas as vítimas, se soma nas ações de solidariedade aos desabrigados que estão sendo chamadas e se compromete a seguir exigindo dos governos investimento de recursos nas medidas preventivas.
Ao mesmo tempo, fazemos um chamado à reflexão: está em nossas mãos (dos explorados, dos oprimidos e da juventude precarizada) mudar os rumos da história da humanidade. Sem romper o ciclo expansionista da acumulação de capital e usar a riqueza produzida pelos trabalhadores e trabalhadoras, para atender às necessidades coletivas da sociedade, ao invés de ser apropriada pela burguesia, a civilização caminhará para a completa catástrofe.
É preciso que rompamos com o capitalismo e construamos uma sociedade socialista. Até que isto aconteça não haverá racionalidade na relação com a natureza.