Inflação dos alimentos e outros motivos por trás da queda de popularidade do governo Lula
O mês de março começou com um alerta amarelo piscando no gabinete do presidente Lula. Uma sucessão de pesquisas constatou uma queda significativa na popularidade do governo, pouco mais de um ano após o início de seu terceiro mandato.
Um levantamento do instituto Inteligência em Pesquisa e Consultoria Estratégica (Ipec), divulgado no dia 8 de março, revelou uma queda de 5% dentre as pessoas que consideram o governo “bom” ou “ótimo”, em relação a dezembro. Já o estudo da AtlasIntel revelou uma queda de 4%, desde janeiro. Um terceiro instituto, o Quaest, constatou uma redução menor, de 36% para 35%, de dezembro até hoje; mas, por outro lado, também concluiu que o número dos que desaprovam o governo saltou de 29% para 34%.
Queda significativa
Institutos diferentes, com metodologias próprias, que captam a mesma tendência, só podem levar a uma mesma conclusão: o povo não anda muito contente com o governo.
Se ainda não é tombo, é um tropeço significativo, ainda mais considerando a sucessão de notícias supostamente positivas que o governo havia divulgado nas últimas semanas: o Produto Interno Bruto (PIB, a soma das riquezas produzidas durante o ano) de 2,9%, acima das expectativas; o anúncio de investimentos de montadoras estrangeiras no país, que movimentariam bilhões; ou a redução do desemprego e da inflação geral.
Se está tudo muito bem, por que o povo não está pulando de felicidade com o governo? As teorias agitadas vão desde uma ofensiva ideológica da extrema direita, com a divulgação massiva de “fake news”, até o discurso, encampado pelo governo, de que se trata, essencialmente, de uma falha de comunicação.
Esse, inclusive, foi o tom da reunião ministerial convocada por Lula, que cobrou de seus subordinados uma propaganda maior de seus feitos: “Se as pessoas não falam bem da gente, ou bem das coisas que a gente fez, nós é que temos que falar”, disse Lula aos membros de seu gabinete, no dia 18 de março.
Debaixo do nariz
Os motivos para o aumento do desgaste de Lula
Hoje, a extrema direita e o bolsonarismo, embora acuados, continuam vivos e atuantes. Mas teria sido isso o que causou essa queda de popularidade do governo do PT?
Basta verificarmos alguns dados da pesquisa Ipec para desmontarmos esta hipótese: a queda na popularidade foi puxada pelos que votaram em Lula (o índice de 69% que consideravam “bom”, caiu para 61%), o mesmo índice apresentado pelos que possuem renda de até 1 salário mínimo. Já no Nordeste, a queda foi de 52% para 43%. Ou seja, nota-se um evidente recorte de classe e social nessa tendência.
O disparo no preço dos alimentos
A explicação está muito mais próxima do que teorias mirabolantes. Está no mercado da esquina. No início do ano, entre janeiro e fevereiro, a inflação dos alimentos, mais especificamente da comida cotidiana, foi o dobro da inflação geral: 2,95% diante de 1,25% do IPCA (o índice considerado oficial). É uma tendência que vem pelo menos desde outubro e que pega os produtos que mais pesam na mesa dos brasileiros, como a batata-inglesa, que subiu 38,24%, ou a cenoura, que disparou 56,99%.
O arroz e o feijão, a base do almoço do trabalhador, subiram, respectivamente, 10,32% e 15,27%. A inflação foi praticamente generalizada nos chamados produtos “in natura” (os produtos frescos) que a gente compra no mercado e nas feiras. Uma subida de preço que pesa, sobretudo, nas famílias mais pobres.
É de se perguntar, a essa altura do campeonato, por que a comida está tão cara, sendo que o agronegócio bombou em 2023?
Crescimento só para os ricos
Não é só a comida, é toda a política econômica do governo
Quase tudo o que a gente come não vem do tão bajulado agronegócio. Os alimentos frescos, as hortaliças, o arroz etc., são produzidos nas pequenas unidades camponesas familiares. O que o agro, que não é “pop”, produz, de forma subsidiada pelo governo (ou seja, paga por nós), é basicamente soja, milho e grãos que vão para exportação ou viram ração para gado.
O agronegócio, controlado por transnacionais e o capital financeiro internacional, lucra, e, veja só, foi o único setor que reduziu o número de empregados. Estamos financiando o desemprego no campo, uma maior dependência da economia e a insegurança alimentar.
A crescente decepção com o governo
Embora, contudo, os alimentos pesem no desgaste do governo, não podemos desconsiderar outros fatores, como a decepção de muitos setores com o governo. Os servidores públicos federais, por exemplo, que votaram massivamente em Lula contra a destruição dos serviços públicos desencadeada por Bolsonaro e Guedes, amargam 0% de reajuste. Não é por menos que os técnicos-administrativos das federais estejam em greve, num movimento que só tende a crescer.
Os operários da fábrica da Avibras, por sua vez, estão com quase um ano de salários atrasados, com os empregos ameaçados e ainda esperam alguma medida do governo. Os trabalhadores da Toyota de Indaiatuba (SP) assistem indignados o anúncio de fechamento da fábrica, mesmo com todos os subsídios garantidos pelos governos.
A inflação dos alimentos é um dos elementos de uma política econômica que garantiu, nesse último ano, um certo crescimento econômico, mas não de forma igual e para todos. Quem se beneficiou de verdade foram as multinacionais, os banqueiros e grandes empresários.
Crescimento no capitalismo é o crescimento dos lucros dos bilionários, à custa da pobreza dos trabalhadores. E propaganda nenhuma do governo vai conseguir convencer o povo do contrário.
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