Lutas

Após aprovação de Lei de Terras, quilombolas do Maranhão sofrem com o avanço de grileiro

Comunidade Pacoã tem sido alvo de ataques e grande devastação ambiental

CSP Conlutas, Central Sindical e Popular

6 de fevereiro de 2024
star5 (1 avaliações)

Os quilombolas do Território Caruma, na Baixada Maranhense, viram as incursões de um grileiro aumentarem, desde dezembro de 2023. Além das ameaças de violência física contra os moradores do local, os invasores também têm devastado grandes áreas de mata nativa.

O momento de tensão ocorre após a aprovação da nova Lei de Terras do Maranhão, que além de proibir a regularização fundiária das comunidades tradicionais, facilitou a compra de grandes terras públicas pelo agronegócio.

Presidente da Associação de Desenvolvimento Comunitário Quilombola dos Moradores do Povoado de Pacoã, Edilson da Silva Leite, está à frente do processo de defesa da comunidade e do meio ambiente. A atuação lhe rendeu inúmeras ameaças de morte.

Eu me lembro quando ele chegou vir aqui em minha casa. Quando me cumprimentou disse que iria guardar bem a minha fisionomia para nunca mais esquecer”, relembra o líder quilombola.

O autor da ameaça teria sido o agropecuarista Paulo Roberto Lopes Cavalcante, conhecido como Paulo Guedes. Desde 2020, o empresário afirma que teria comprado a área. De lá pra cá, ele já tentou por diversas vezes expulsar as famílias.

Em meados de dezembro começaram a chegar as primeiras máquinas para “limpar o terreno”. A invasão das terras, levou os quilombolas a realizarem um grande protesto no dia 6 de janeiro, impedindo que os tratores continuassem o desmatamento.

Porém, no dia 9, um terceiro trator chegou à região. Carros com homens armados levaram terror à comunidade que possui inúmeras mulheres e crianças. A polícia esteve presente no local, mas ninguém foi preso.

Ele já desmatou muito”, lamenta Edilson. “Nós estimamos mais de 100 hectares. Ao menos 350 palmeiras já foram derrubadas. Ele quer abrir essas estradas e pelo caminho vai matando nascentes de água também, inclusive aquelas que abastecem a cidade de Pinheiro”.

Edilson explica que apesar de terem conquistado recentemente na justiça a reintegração de posse, Paulo Guedes segue agindo à revelia da Lei e ameaçando de morte todos aqueles que se levantam contra seus crimes.

Ele se diz um homem sem freio e que ninguém pode pará-lo. Continua nos ameaçando, dizendo que até pode perder a terra na Justiça, mas que vai levar com ele algum líder da comunidade. Diz que resolve na bala”, denuncia Edilson.

Vereador é cúmplice

O responsável por levar Paulo Guedes à região é o vereador de Pinheiro Rubemar Ribeiro (PDT). Edilson explica que o político tentou retirá-lo da presidência da Associação e também teria feito ameaças no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Pinheiro. A suspeita é que Ribeiro também tenha interesse nas terras qilombolas

Entenda as mudanças na Lei de Terras

A Lei 12.169/2023 foi sancionada pelo governador do Maranhão, Carlos Brandão (PSB), em dezembro do ano passado, e ficou conhecida como a Lei da Grilagem, devido ao seu caráter de favorecimento aos grandes empresários do agro.

O texto amplia de 200 para 2.500 hectares a possibilidade de compra de terras públicas pela iniciativa privada e extingue as terra devolutas reservadas, incluindo aquelas que possuem ecossistemas originais que devem ser protegidos.

Diversas entidades denunciam que a Lei da Grilagem irá aumentar o conflito no campo, em um estado já marcado pela grande violência contra quilombolas, indígenas e comunidades tradicionais.

Ainda há o fato do poder público estar abrindo mão de 15 milhões de terras agricultáveis. A entrega do patrimônio público lesa a pátria pelo valor estimado da área (R$ 60 bilhões), bem como fere o direito à terra de milhares de brasileiros.

Atualmente a lei está sendo questionada no STF (Supremo Tribunal Federal). A matéria é objeto da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7588, distribuída ao ministro Luiz Fux. Ainda não há data para o julgamento.

Anos de espera

Edilson também conta que a comunidade entrou com pedido de titulação das terras no INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) em 2007. Apesar de já ter sido condenado na justiça pela morosidade, os quilombolas de Pacoã ainda não possuem o documento.

Maranhão violento

O estado do Maranhão é considerado o mais perigoso e violento para as comunidades tradicionais. Os inúmeros casos de assassinatos e invasões é reflexo da conivência dos governos em todas as instâncias.

O cenário já é de extrema violência, mas estamos ainda mais preocupados depois da aprovação da Lei de Terras”, afirma Wagner Silva, ativista do Moquibom e da CSP-Conlutas Maranhão.

Essa lei foi aprovada em caráter de urgência sem nenhum debate público. É uma clara exclusão de todos aqueles impactados pelo projeto. Tão logo a lei foi aprovada na Assembleia Legislativa, no mesmo dia o governador Carlos Brandão sancionou”.

Toda solidariedade

A CSP-Conlutas manifesta apoio à todos aqueles que lutam por terra, moradia e melhores condições de vida. É fundamental que os crimes de Paulo Guedes sejam denunciados e exigimos uma resposta imediata da Justiça e do governo Lula.

“Não é coincidência que assim que a lei recebe a aprovação os tratores comecem a invadir o território de Pacoã. Nesse momento, é fundamental cobrir de solidariedade os quilombolas em luta no Maranhão”, conclui.