Conheça o Grupo Wagner, os neofascistas que ganharam poder e se enriqueceram servindo Putin
Publicado originalmente no Portal da LIT-QI em março de 2022
O chamado Grupo Wagner não pode ser visto como uma empresa com seus ritos formais. É uma organização de empreiteiros militares privados que se articulam para uma rede de negócios mercenários com diversos fins. Entre esses negócios, podemos citar: reprimir protestos populares, estabilidade a governos fantoches, disseminação de fake news, etc. Em troca, eles recebem autorização para mineração de ouro, diamantes e outros recursos naturais.
Seus comandantes, como Dmitry Outkine Utkin, são admiradores de Hilter e concordam com a ideologia nazista. Por isso se colocaram a serviço de Putin, que é um governante burguês de ultradireita.
O Grupo Wagner é uma empresa burguesa que defende os interesses e investimentos dos grandes magnatas russos e seus aliados, mas além disso são embutidos de todo o preconceito “gran russo” denunciado por Lênin. Defensores da tese de que é necessário oprimir as demais nacionalidades para melhor explorar e enriquecer.
Yevgeny Prigozhin, o cozinheiro de Putin comanda o Grupo Wagner
O articulador e principal financista do Grupo Wagner é Yevgeny Prigozhin que não tem origem militar. No final da década de 90, ele abriu um restaurante que era frequentado pelo então conselheiro do prefeito de São Petersburgo, Vladimir Putin. O conselheiro virou presidente do país e seguiu frequentando o restaurante do amigo, que pôde expandir seus negócios para o fornecimento de alimentos e refeições para abastecer o Kremlim, fornecer a merenda escolar e o rancho para os militares. Prigozhin é conhecido como o cozinheiro de Putin. Essa relação próxima permitiu que seus negócios seguissem se expandindo.
Uma mercadoria chamada guerra
Em 2011 explodiu a Primavera Árabe, e em seguida as guerras civis na Líbia e na Síria. Nesses países a burguesia russa viu seus investimentos em risco. A intervenção nesses processos não poderia ser através das forças regulares russas e a alternativa foi a introdução dos chamados conflitos de geração “híbrido” e, para tanto, foram criadas as Forças de Operações Especiais Russas (SOF – “Special Operational Forces”) e as primeiras PMC (“Private Military Company”). Em uma entrevista, Putin disse que “as empresas militares privadas são uma ferramenta única nas mãos do Estado, portanto, não podem realizar tarefas sem estarem vinculadas a ele”.
Primeiro foram criadas as Forças de Operações Especiais (SOF) subordinada ao Estado Maior. Uma força capaz de realizar “reconhecimento, sabotagem, subversão, contraterrorismo, contra sabotagem, contrainteligência, guerrilha, antipartidária e outras ações”. Todo dia 27 de fevereiro é comemorado como dia nacional da SOF (Forças de Operações Especiais). Essa data foi instituída pelo Presidente da Federação Russa: “A data do feriado não foi escolhida por acaso. Em 27 de fevereiro de 2014, homens armados em camuflagem não identificada assumiram o controle do prédio do Conselho Supremo e do governo da República Autônoma da Crimeia, que na época fazia parte da Ucrânia, e nos dias seguintes sobre o aeroporto de Simferopol e outras instalações estratégicas da península. Além disso, ajudaram a garantir a ordem e a segurança durante o referendo de 16 de março de 2014 sobre a anexação da Crimeia à Rússia” (publicado aqui).
O segundo passo foi a criação da primeira empresa militar privada (PMC), a Slavonic Corps Limited, e o objetivo era comercializar guerras através do uso de exércitos privados de fato. Mais uma vez, de acordo com Putin: “criação das PMC tornou-se um passo importante no desenvolvimento qualitativo das Forças Armadas russas, aumentando sua mobilidade e prontidão para o combate. O país tem outra ferramenta poderosa e eficaz para proteger os interesses nacionais”. Os interesses nacionais a que se refere Putin, como veremos mais adiante, serão os recursos minerais e naturais, especialmente na África.
Wagner na Ucrânia em 2014 a serviço da contrarrevolução
O início da utilização das PMCs e SOFs foi na Primavera Árabe. Quando explodiu a crise na Ucrânia, o país se tornou um real campo de treinamento dessas empresas russas. Aproveitando-se dos impactos das lutas da Praça Maidan, a divisão interburguesa e o debilitamento do Exército ucraniano após a anexação da Criméia, as PMCs russos mostraram-se eficazes na realização de operações paramilitares, incluindo ataques frontais, guerra de guerrilha e antiguerrilha, bem como sabotagem. Assim, a Ucrânia tornou-se indiscutivelmente um “campo de testes” para uma missão de maior lucratividade, a Síria.
As operações na Crimeia ucraniana e no Donbass, e a anexação da Crimeia (janeiro-março de 2014), com o uso intensivo de PMCs e SOFs, criaram as condições necessárias para a futura atuação na Síria. Sem essa preparação na Ucrânia teria sido impossível. Nesse processo de preparação e seleção, sobressaiu-se como uma das mais preparadas PMCs, o chamado Grupo Wagner.
Neofascistas russos a serviço da opressão nacional
Uma das justificativas que Putin tentou dar para a ocupação da Ucrânia era a presença de forças fascistas naqueles país, e que a sua ocupação era para liberar os ucranianos destes fascistas. É verdade que o Batalhão Azov atua na Ucrânia sob a complacência do governo, no entanto, o comando do Grupo Wagner tem a mesma ideologia, e está melhor preparado e equipado para combater os processos revolucionários onde eles surjam.
- Janjaweed e o Grupo Wagner: A milícia sudanesa Janjaweed é uma das mais violentas no mundo. Nas grandes mobilizações pela derrubada do ex-ditador al Bashir, a Janjaweed, agora conhecida como Força de Apoio Rápido, matou mais de 100 jovens em uma concentração. A Janjaweed é estreitamente ligada ao Wagner Group.
- Assumoi Goita, golpista no Mali, fechou o Congresso e resolveu se perpetuar no poder. Pressionado pelo imperialismo francês, procurou e obteve apoio da Wagner Group para poder se estabilizar.
- A Operação Wagner está diretamente relacionada ao assassinato de três jornalistas russos que foram à República Centro Africana para investigar o tráfego de armas na guerra civil. O mesmo se passou com o jornalista sírio, crítico da Wagner, que morreu ao cair em situação bastante suspeita da área do apartamento onde morava.
- Os jovens nazistas e a Wagner. Os irmãos Vladislav e Artem Krasnolutsky não negam para ninguém sua adoração pelo Terceiro Reich e pelo nazismo. Vladislav morreu combatendo na Síria e trabalhando para a Wagner. Artem foi condenado a onze anos de prisão, acusado de sequestro, fugiu da cadeia e se incorporou a Wagner.
- Fundador do Wagner Group e nazista: Dmitry Outkine Utkin, e reconhecido como um dos fundadores da Wagner, condecorado por Putin. Dmitry gosta de aparecer com cara de mau e sem camisa. Nas fotos podemos ver as tatuagens na nazista no seu corpo. Admirador do Terceiro Reich, Dmitry tatuou no ombro dois brasões. Um da Schutzstaffel, mais conhecido como SS; e outra com a Reichsadler, a águia nazista e emblema do Terceiro Reich
- A incrível história do tablet deixado para trás em uma batalha perdida. A Wagner Group atuou na Líbia defendendo o Gal. Khalifa Aftar e as instalações petroleiras que ele havia se apropriado durante o conflito naquele país. Numa das batalhas, um soldado da Wagner deixou para trás um tablet com manuais de minas anti pessoais, dispositivos explosivos improvisados, imagens de reconhecimento captados por drones, e alguns livros com Minha Luta, de Adolf Hitler.
Todos os elementos acima comprovam que a Wagner e outras exércitos privados da Rússia não tem nada de libertário, como todo grupo paramilitar carrega dentro de si ideias e métodos nazistas.
Exércitos privados a serviço de ditadores, das transnacionais e dos ladrões de recursos minerais
No passado, a extinta União Soviética enviava seus soldados para Angola, Moçambique e outros países para apoiar – à sua maneira – governos nacionalistas burgueses ou que tinham passado por processos independentistas. Hoje, depois da restauração do capitalismo na Rússia, subordinando o país ao sistema capitalista mundial em sua fase imperialista, os soldados russos, através de exércitos privados como a Wagner Group e outros, saem em defesa de ditadores, empresas transnacionais e se aproveitam para participar do roubo e pilhagem dos recursos naturais. Vejamos alguns exemplos:
Wagner na Síria
A ação russa na Síria foi realizada por forças regulares e por PMC, em especial pelo Grupo Wagner. Nesse período de seis anos, aproximadamente 7.000 civis morreram em consequência de ataques aéreos praticados pelas Forças Aeroespaciais Russas. De acordo com o relatório da Rede Síria para os Direitos Humanos (SNHR), publicado em setembro de 2021, os bombardeios provocaram a morte de 6.910 pessoas, dos quais 2.030 eram crianças.
Além das forças regulares, também participaram diversas PMCs. O transporte inicial de mercenários da PMC Wagner foi com aeronaves da 76ª Divisão Aerotransportada cedidas pelo Ministério de Defesa russo. Hoje se utilizam de transporte aéreo civil pertencentes à companhia aérea síria Cham Wings.
A agência de notícias AP informou que recebeu uma cópia do contrato entre a Euro Polis, empresa associada a Prigozhin, e à estatal síria General Petroleum Corp. O contrato estipula que a Euro Polis receberá “25% do produto da extração de petróleo e gás dos campos que seus contratados capturarão e protegerão dos militantes do Estado Islâmico”.
Wagner em Moçambique
Moçambique é um dos países mais pobres do mundo. Cabo Delgado, no extremo norte, é a província mais pobre do país. Lá foi descoberto GNL e hoje é um dos maiores projetos de investimento na África. Os investidores das empresas Total (francesa), ENI (italiana), Chevron (USA) e Rosneft (russa). A população sonhou com uma nova vida de emprego e dignidade. O sonho não se realizou, pois veio um pesadelo em forma de grupos armados islâmicos. Degolando homens, violando mulheres, sequestrando meninos para a luta armada e as meninas para escravas sexuais. Quem financia esses grupos tão bem armado e o pagamento de salários para tantos soldados?
O aeroporto de Nacala, em setembro de 2019, viu chegar um avião de transporte russo Antonov 124 e entregar equipamento militar enviados para Cabo Delgado. Há registro fotográficos do Antonov 124 realizando descarregamento de caminhões e helicóptero de transporte Mi-17.
Declarada a guerra ao suposto grupo islâmico, foi instalado um clima de terror. Como resultado, mais de um milhão de pessoas deslocadas para outra regiões. Assim, os russos em guerra com os islâmicos, começaram a limpar o terreno para as empresas francesa, italiana, norte-americana e russa.
Em sua entrevista anual em 2018, no dia 20 de dezembro, o presidente russo Vladimir Putin afirmou: “Se esse ‘grupo Wagner’ violar alguma coisa, a Procuradoria-Geral da República deve fazer uma avaliação legal. Sobre a presença deles em qualquer parte no exterior, repito mais uma vez: eles não violam a lei russa, eles têm o direito de trabalhar, de promover nossos interesses comerciais em qualquer lugar do mundo”.
Em um dos países mais pobres do mundo, em sua região mais pobre, Cabo Delgado, a Wagner Group atuou para que as empresa TOTAL, ENI, CHEVRON, francesa, italiana e norte-americana respectivamente, pudessem saquear o GNL desse país. Estão confrontados com a ocupação da Ucrânia, mas fazem uma aliança com essas multinacionais imperialistas com a condição que a Rosneft (russa) participe desse roubo.
Wagner no Sudão
Após a divisão do país em 2011, o Sudão teve que reorganizar sua economia já sem o petróleo que havia ficado com o Sudão Sul. A estrutura do governo do ditador al-Bashir se apoiava no complexo militar (Exército, polícia e órgãos de inteligência), mas isso era insuficiente, era preciso mais. Nesse período, a repressão foi terceirizada através do serviço sujo prestado por grupo de milicianos. Essas milícias impuseram o controle sobre as terras húmidas, savanas e deserto secos que abrigavam em seu subsolo petróleo e exploração de ouro. Quando os preços internacionais do petróleo caíram, o Sudão passou a aumentar a produção agrícola e de gado para controlar a balança comercial. As milícias organizaram patrulhas para garantir as safras, compraram um banco (Banco Pecuário) e puderam criar o seu próprio banco (Gulf Bank) em parceria com capitalistas dos Emirados Árabes.
Janjaweed foi a milícia que mais se desenvolveu e foi unificando e incorporando outros pequenos grupos de milícias locais. A Janjaweed se transformou em uma força regular denominada Forças de Apoio Rápido. A Janjaweed se fez dominante, pois contou com a unificação de vários grupos e gangues, equipamentos superiores, principalmente veículos de tração nas quatro rodas equipados com metralhadoras, mas acima de tudo com o apoio material e logístico do Estado controlado pela ditadura de al-Bashir.
Em 2019, quando a Janjaweed já tinha se transformado em Forças de Apoio Rápido foram responsáveis pelos assassinatos em massa de mais de cem manifestantes contra a ditadura de al Bashir.
Com a queda de al-Bashir e assunção do governo transitório, o tenente-general Mohamed Hamdan ‘Hemeti’, comandante das Forças de Apoio Rápido (RSF) foi nomeado como vice-presidente do Conselho Soberano.
As ligações de Hemeti, comandante das Forças de Apoio Rápido, com a exploração e contrabando de ouro, são permanentemente denunciadas pela oposição sudanesa. Assim como a vinculação de Hemeti com o Grupo Wagner.
Desde 25 de outubro de 2021, o povo sudanês voltou às ruas exigindo o fim do governo militar de Burhan (aliado de al-Bashir), com gigantescas manifestações semanais, e mais de 100 mortos pelas Forças de Apoio Rápido.
Logo após a invasão da Ucrânia, Mohamed Hamdan ‘Hemeti’, fez uma visita oficial à Rússia organizada pelos mercenários russos Wagner para encontrar uma saída para o seu aliado no Sudão e assegurar a sua permanência no poder para que possam continuar a saquear os recursos do país.
Wagner na República Centro Africana
A instabilidade política na RCA se traduz em uma guerra civil que já dura quase uma década. As forças do governo controlam apenas cerca de um quinto do território da RCA, com cerca de uma dúzia de facções rebeldes ativas em grande parte do país.
No início de 2018, a Rússia recebeu autorização do Conselho de Segurança da ONU para fornecer armas ao governo do país. Junto com as armas, enviou 170 instrutores militares vinculados às PMCs, em especial a Wagner.
O presidente da RCA, Faustin-Archange Touadera, foi convidado para o Fórum Econômico Internacional de São Petersburgo em 2017, onde se encontrou com o presidente Putin. Passadas algumas semanas, começaram a chegar os instrutores militares russos. Touadera nomeou um russo, Valery Zakharov, como seu conselheiro especial de segurança.
Zakharov, tem relação com a empresa M-Finans, uma das várias empresas russas ativas na RCA. A M-Finans foi administrada por Yevgeny Khodotov até junho de 2021, quando a vendeu para sua esposa. Documentos da empresa descrevem sua atividade principal como “extração de pedras preciosas”. A vinculação com as operações da Wagner fica claro na medida em que o endereço de e-mail da M-Finans tem mesmo domínio da Concord Catering, parte do império Prigozhin, o homem forte da Wagner.
Logo após o início das operações de treinamento russo, várias empresas reiniciaram operações em minas de diamante que haviam sido fechadas por conta da guerra civil. Algumas dessas minas estão em território controlado por rebeldes, mas as autoridades russas estabeleceram um relacionamento com vários dos grupos, mesmo enquanto treinavam as forças de segurança do governo.
O painel de especialistas da Nações Unidas acusa os instrutores russos que operam em coordenação com as forças armadas da República Centro-Africana de assassinatos indiscriminados, saques e desaparecimentos forçados realizados no país. Ainda que o relatório do Conselho de Segurança da ONU não acuse formalmente os membros da Wagner, informalmente o grupo de trabalho assim o reconhece.
Poderosas empresas gigantes de diamante como De Beers e Signet puderam recuperar sua rede de fornecedores no país desde a Wagner Group começou a dar sustentação ao governo e negociar com as milícias. Ao mesmo tempo, uma das empresas de Prigozhin, a Lobaye Invest, recebeu várias concessões para minerar diamantes e ouro.
Obviamente, que não foi no convencimento, foi à custa de muitos assassinatos, inclusive de cidadãos russos.
Wagner e o último golpe de Estado no Mali
Desde o golpe de Estado, em agosto de 2020 e que derrubou o governo de Ibrahim Boubacar Keïta, um aliado incondicional da França, o Mali, vive uma grande instabilidade. O novo governo autointitulado de Comitê Nacional para a Salvação do Povo, encabeçado pelo coronel Assimi Goïta. Assimi recebeu treinamento nos Estados Unidos, França e Alemanha, e tem experiência de trabalho com as Forças Especiais do Exército dos Estados Unidos.
Assimi Goita, que propôs inicialmente um governo provisório e eleições em 18 meses, retrocedeu e resolveu estender o seu mandato para seis anos. A discussão de fundo não é sobre a extensão do mandato, mas sobre a relação com o Estado francês que mantém o país ocupado há anos pelas tropas da Operação Barkhane, e que provocou mais violência e indignação e resistência da população. Assimi tem que controlar a ira da população e crise no interior das FFAA do Mali por conta das sucessivas derrotas militares para os grupos islâmicos.
Essa relação tensa levou que a França movesse suas fichas juntos à Comunidade de Estados da África Ocidental (CEDEAO), União Econômica, Monetária da África Ocidental (UEMOA) e União Africana (UA) pressionando por eleições imediatas.
Assimi, pressentindo a pressão, buscou novos aliados e encontrou nos russos da Wagner Group proteção militar e controle das mobilizações. Com o novo aliado, Goita expulsou o Embaixador francês, ato contínuo, as tropas francesas se retiraram do país, assumindo o controle militar a PMC Wagner. A repressão seguiu a mesma para o povo maliano. Quanto à exploração do ouro e controle do urânio na fronteira com o Niger, agora têm novos e reais interessados.
Ao mesmo tempo, os russos estão participando na ocupação da Ucrânia e confrontando-se com os interesses do imperialismo europeu e norte-americano. No Mali, a relação é outra. A Wagner está controlando o país e não tomou nenhuma medida contra as empresas de mineração de ouro, fosfato e urânio de propriedade europeia ou norte-americana.