Atentado de Roberto Jefferson mostra projeto da extrema-direita e do bolsonarismo
O atentado realizado pelo ex-deputado e aliado de Bolsonaro, Roberto Jefferson (PTB), contra policiais federais que cumpriam um mandado de prisão neste domingo, 23, é resultado direto da política do presidente de incitar a extrema-direita e a sua base contra adversários e de criar um clima de conflagração a poucos dias do 2º turno das eleições.
O ato se mostrou precipitado, se não um verdadeiro desastre. Atordoou a base bolsonarista e prejudicou a imagem de Bolsonaro, que está sendo obrigado a se distanciar da imagem do aliado. A primeira reação do presidente foi criticar a ação de Roberto Jefferson, mas relativizando, e até justificando de certa forma com o que considera uma perseguição do Supremo Tribunal Federal (STF). Só depois foi obrigado a mudar completamente o discurso e se desligar do aliado.
A estratégia prioritária de Bolsonaro continua sendo a de ganhar as eleições nas urnas, e para isso atua desesperadamente. Por outro lado, o atentado mostra como o bolsonarismo age para manter a sua base insuflada, tanto para criar um clima de intimidação, como para agir mais à frente no caso de uma derrota eleitoral, com a hipótese, inclusive, de reproduzir aqui um episódio à lá Capitólio. E mostra ainda como as instituições dessa democracia burguesa são incapazes, quando não coniventes, diante das ameaças da extrema-direita.
Um dia vergonhoso
O líder do partido aliado de Bolsonaro cumpria prisão domiciliar por conta do inquérito das fake news e de ataques às instituições (leia-se defesa da ditadura), quando desobedeceu as restrições de sua condição e divulgou vídeos na Internet xingando a ministra do STF e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Carmen Lúcia, de forma machista e misógina. Diante disso, o relator do processo, o ministro Alexandre de Moraes, decidiu revogar a sua prisão domiciliar e fazê-lo retornar ao regime fechado.
A sucessão de eventos que ocorre após isso é o roteiro completo do projeto bolsonarista de extrema-direita. Jefferson recebeu os agentes da Polícia Federal a bala, disparando com um fuzil contra os servidores e atirando granadas, segundo o próprio, bombas de efeito moral, ferindo dois deles. Entrincheirado, o ex-deputado divulgou vídeos afirmando que não se entregaria e incitou aliados à rebelião armada.
Fosse um jovem negro da periferia não haveria dúvida que seria trucidado ali mesmo. Lembrando que os famigerados “autos de resistência”, ou resistência à prisão forjados, são as justificativas mais frequentes para o assassinato de jovens pobres pela polícia. Mas o aliado de Bolsonaro teve tratamento VIP: exigiu a presença do próprio Ministro da Justiça para negociar sua rendição, contou com a ajuda do “Padre” Kelmon para entregar suas armas à polícia e teve 8 horas para dar uma arrumada na casa antes da entrada das autoridades. Provas ou qualquer coisa que o incriminasse podem ter sido “sumidas” nesse tempo com a maior tranquilidade.
A cereja do bolo veio já no final do dia, com a divulgação de uma conversa mais do que amistosa entre o marginal e um agente da própria PF. Entre sorrisos, o policial critica os colegas feridos que foram realizar a prisão (“são burocratas”) e assegura a Jefferson que irão “fazer tudo o que ele precisa”.
Jefferson é Bolsonaro
A primeira coisa a se reforçar nesse episódio é que, ao contrário do que Bolsonaro vem tentando fazer parecer, Roberto Jefferson é um aliado, e alinhado, à estratégia bolsonarista de ataque, intimidação e de incitação de sua base de extrema-direita contra qualquer resultado neste 2º turno que não seja a vitória do presidente.
O deslocamento do ministro da Justiça e a atitude apaziguadora da PF não deixam margem para dúvida de que Jefferson pode até ter se precipitado no atentado, mas mantinha contato direto com o governo. Tanto que o Planalto e os bolsonaristas, num primeiro momento, relativizaram e até defenderam o ex-deputado, para só depois no final do dia, com a repercussão negativa do fato (inclusive dentro da própria corporação dos PF’s e agentes de segurança em geral), se reposicionarem e repudiarem o ataque.
Outro fato que emerge disso é o real objetivo dos chamados “CAC’s” (Colecionador, Atirador Desportivo e Caçador), uma manobra utilizada pelo bolsonarismo para organizar e armar suas milícias com verdadeiros arsenais. Após sucessivos decretos presidenciais liberando essa modalidade, o contingente dos CACs supera hoje o da própria segurança pública. Com um discurso pela liberdade, o que Bolsonaro pretende realmente, e vem implementando, é o de armar milícias que possa utilizar e dar suporte a seu projeto de ditadura, incitando-as contra adversários ou até mesmo as utilizando para uma sublevação.
Ameaça às liberdades democráticas
O terceiro ponto a se considerar é como as instituições são ineficazes para proteger essa democracia dos ricos da qual fazem parte. O que assistimos neste domingo foi uma completa desmoralização: como um presidiário mantinha um arsenal em casa? Como um presidiário contava com licença de CAC, com o conhecimento do próprio Exército? Como Roberto Jefferson mantinha contato direto e articulações com o governo?
As sucessivas ameaças de Bolsonaro às liberdades democráticas começaram tão logo ele tomou posse. Desde o início de seu mandato, ele deixou evidente que seu projeto é o de uma ditadura, e de criar as condições para isso. De lá para cá, entre altercações com as instituições, principalmente o STF, Bolsonaro vem passando a boiada. Dos crimes cometidos durante a pandemia, às sucessivas denúncias de corrupção abafadas, ao “orçamento secreto” e o pacote bilionário eleitoral, o governo passa por cima de qualquer lei para se proteger e se perpetuar no poder, e fica tudo por isso mesmo.
O tal “sistema de pesos e contrapesos” dessa democracia burguesa mostra-se uma verdadeira falácia diante do bolsonarismo. Está mais do que evidente que, diante do projeto bolsonarista de se fechar o regime, seja por uma sublevação direta, ou alterando o STF como já defendeu, não serão essas instituições como o Judiciário ou o Congresso Nacional que o irão impedir.
O significado do ataque
Dois erros podem surgir do atentado deste domingo. O primeiro é o de superestimar o fato e considerar que estamos à beira de um golpe da extrema-direita. Fosse isso, o que estaria colocado para a esquerda e as organizações dos trabalhadores seria, prioritariamente, se defender, inclusive militarmente, a fim de impedir o fim das já restritas liberdades democráticas que temos hoje. A reação do próprio Bolsonaro mostrou que foi literalmente um tiro que saiu pela culatra, ou no mínimo uma grave precipitação. Outro erro seria o de, pelo contrário, subestimar esse ataque e a série de intimidações de Bolsonaro e da extrema-direita, taxando-o de mera cortina de fumaça diante da política de Guedes e do governo de congelarem o salário mínimo e as aposentadorias.
Não está colocado na ordem do dia um golpe de Bolsonaro, e o seu desespero em ganhar as eleições nas urnas mostra isso. Por outro lado, seu movimento de ameaçar contestar um resultado desfavorável, utilizando as Forças Armadas, e a incitação à base de extrema-direita, assim como o desejo expresso de mudar o STF, revelam seu projeto de fechar o regime e acabar com as liberdades democráticas.
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Derrotar Bolsonaro nas eleições e avançar na mobilização
Diante disso, o PSTU reforça o chamado ao voto crítico em Lula neste 2º turno, a fim de derrotar Bolsonaro nas eleições. À frente do aparelho do Estado, o bolsonarismo tem melhores condições de impor o seu projeto. Mas reafirmamos também que, uma vez derrotado, o bolsonarismo não desaparecerá. Só terá fim mudando as condições econômicas e sociais que condicionaram seu surgimento e fortalecimento. E elas não mudarão com esse programa e as alianças de classe representadas pelo PT. Por isso, o voto crítico e o chamado a não depositar nenhuma confiança num eventual governo Lula-Alckmin. Sua desmoralização ao manter essa política econômica que só favorece os superricos e bilionários e, num capitalismo em crise, redundará em inevitáveis ataques aos trabalhadores, e no consequente fortalecimento da extrema-direita.
Neste 2º turno votamos 13, mas não achamos que essa alternativa represente uma mudança de fato. Precisamos derrotar Bolsonaro nas eleições, mas, também avançar na organização independente da classe trabalhadora, na luta por emprego, salário e direitos, e inclusive na autodefesa da classe. Junto a isso, avançar na construção de uma alternativa revolucionária e socialista, num outro projeto de sociedade que realmente mude as condições de vida da classe trabalhadora e do povo pobre.