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O programa de Lula: neoliberalismo ou desenvolvimentismo?

Júlio Anselmo

9 de setembro de 2022
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Lula e Alckmin se reúnem com empresários Foto Divulgação

O PT fala em “adotar uma estratégia nacional de desenvolvimento justo, solidário, sustentável, soberano e criativo, buscando superar o modelo neoliberal que levou o país ao atraso”. O centro deste projeto é aumentar os gastos do Estado em supostos investimentos para impulsionar os empresários brasileiros e estrangeiros, com o objetivo de aumentar a produção e reindustrializar o país.

Mas será que, nos marcos do capitalismo, é possível desenvolver o país, resolver os problemas da vida dos trabalhadores e trabalhadoras, acabando com nosso atraso e as desigualdades sociais crônicas?

Bolsonaro é um governo neoliberal, principal responsável pela tragédia social e econômica do país, hoje. O que se convencionou chamar de neoliberalismo é a política econômica capitalista, impulsionada a partir dos anos 1970, que inclui desde privatização e desnacionalização das economias dos países periféricos, até a exigência de uma política fiscal que limite os investimentos nas áreas sociais, significando, também, um desmonte dos serviços públicos.

Tudo isto baseado num tripé formado por câmbio flutuante, meta de inflação e superavit primário, utilizado para garantir a remuneração dos capitalistas, através da dilapidação do orçamento público.

PT não romperá com lógica neoliberal

Os governos do PT não romperam com estas medidas neoliberais. Nem romperão. Por exemplo, uma das expressões mais nítidas do neoliberalismo nos últimos anos é a Lei do Teto de Gastos. E Lula, mesmo quando critica esta lei, reafirma que irá respeitar o teto de gastos, apenas demarcando que, por ser bom respeitador da responsabilidade fiscal, ele não precisará usar da lei.

Em seus governos anteriores, ao mesmo tempo em que seguia o neoliberalismo, o PT tentou impulsionar setores especiais da burguesia, através de incentivos do Estado. É isto que chamam de “desenvolvimentismo”.

O que aconteceu? Depois do “boom” dos preços das commodities e do esgotamento do ciclo de crescimento econômico mundial, a medida se provou incapaz de fazer o país avançar, gerando apenas reprimarização da economia (foco na exportação de recursos agrícolas e minerais) e mais dependência do imperialismo. Ou seja, seguimos atrasados e retardatários e nos limitando a simples produtores de commodities.

Mesmo essa alternância (entre mais ou menos gastos estatais) corresponde ao funcionamento normal do capitalismo. É a alternância dos ciclos econômicos e das necessidades do próprio capital. Na verdade, por mais que digam o contrário, não há uma contraposição entre este suposto “desenvolvimentismo” do PT e o neoliberalismo.

Sócio do imperialismo

Não existe burguesia “desenvolvimentista”

Óbvio que há conflitos de interesses entre os setores burgueses. Mas isto não significa que a realidade se explique, como vê o PT, através da luta entre um setor neoliberal da burguesia contra outro setor, supostamente desenvolvimentista. Ou entre um setor financeiro contra o setor produtivo; ou, ainda, que coloque a burguesia nacional versus a burguesia estrangeira. Muito menos quer dizer que exista algum setor progressivo, que atenda aos interesses dos trabalhadores, em contraposição a outro, reacionário.

Primeiro porque, na atual fase do sistema, os setores capitalistas estão interligados e dominados pelo capital financeiro, que domina não só as finanças, mas as indústrias, o setor comercial e o campo. Basta vermos o domínio dos bilionários fundos de investimento e bancos, controlando grandes conglomerados industriais. Então, esta divisão entre setor produtivo e especulativo não se sustenta. Estão todos interligados.

Segundo, não há uma burguesia nacional contraposta à imperialista. Mas, sim, uma burguesia nacional associada ao imperialismo. Uma burguesia que nasceu atrelada à burguesia internacional, em uma ligação umbilical. O imperialismo explora o país diretamente com suas próprias empresas e indiretamente, através da sua ligação com as empresas brasileiras. De tal modo que uma libertação do imperialismo pressupõe a derrota da própria burguesia nacional.

Uma burguesia parasitária e reacionária

Terceiro, no Brasil, a burguesia se tornou parasitária e financeira antes de ter concluído vários aspectos do desenvolvimento industrial capitalista visto em outros países. O país foi construído sobre o tacão do capitalismo, desde sempre associando formas sociais e produtivas arcaicas com as modernas, de tal modo que nossa burguesia se tornou reacionária, antes mesmo de ter sido progressiva em algum momento da história.

Portando, o objetivo do PT é, na verdade, justificar sua tese de apoiar e governar o capitalismo. Assim, tenta dissolver a luta real (que se trava entre os interesses dos trabalhadores e da burguesia) em uma disputa entre setores burgueses, levando os trabalhadores à submissão a um suposto setor burguês “desenvolvimentista”.

Mas a história do país demonstra o contrário. Não há possibilidade de desenvolvimento econômico e social sem romper com o imperialismo, sem expropriar a burguesia e sem tomar medidas de transição ao socialismo. Por isso, dizemos que, para derrotar o neoliberalismo, precisamos derrotar o capitalismo, enfrentar os super-ricos e as 100 maiores empresas que controlam mais de 60% do Produto Interno Bruto (PIB) do país.